Zona Curva

Indígenas Brasil

O histórico Ministério dos Povos Originários

A posse de Sônia Guajajara como ministra do Ministério dos Povos Originários foi recheada de emoção e simbolismo. Não por acaso, feita junto com a posse de Anielle Franco no Ministério da Igualdade racial. Por isso mesmo, reuniu negros, indígenas, quilombolas, ribeirinhos e toda essa gente que sempre esteve fora dos círculos de mando no país. Foi bonito de ver. No caso dos povos originários é importante lembrar que o Brasil tem o maior número de etnias. São 305 etnias e 274 diferentes línguas. Segundo os últimos números do IBGE são quase um milhão de indígenas que ocupam 13% das terras brasileiras. Observando a população geral, o número parece pequeno, mas há que observar a importância destas comunidades na proteção do ambiente. Os povos originários carregam na sua cosmovivência a ideia de que não há separação entre o homem e a natureza, daí o cuidado que têm com o espaço geográfico no qual habitam. E esta é uma prática que favorece toda a população. Foram os povos originários os primeiros a serem atingidos pelo governo de Jair Bolsonaro quando assumiu o mando em 2019. Sua proposta era acabar com a proteção das comunidades e integrar os indígenas ao mundo do trabalho, expulsando-os de suas terras e jogando-os nas cidades para engrossar o cordão de misérias. E desde o primeiro dia os povos originários lutaram contra isso, sofrendo as mais duras violências. A prática da invasão de terras por grileiros, fazendeiros, madeireiros e mineradores, incentivada pelo governo, garantiu mortes, estupros e outras violências de todo o tipo. Foram suspensas as demarcações de terras indígenas e começou uma campanha para anular as que já haviam sido feitas. Uma luta sem trégua foi travada e por isso mesmo foi extremamente simbólico ver toda aquela festa no centro do poder político. Além do Ministério dos Povos Originários dirigido por Sônia Guajajara, a Funai – desmantelada durante o último governo – também será comandada por uma indígena, a deputada Joênia Wapichana, e a partir de agora passará a se chamar Fundação Nacional dos Povos Originários, saindo do Ministério da Justiça e integrando-se ao dos Povos Originários. É a primeira vez na história que os povos indígenas formularão eles mesmos as políticas para suas comunidades. Este é um desafio importante para os povos originários que precisarão dar contas de seus dramas e problemas cotidianos – tais como as demarcações de terra, saúde, educação e outros – bem como da necessária compreensão de que o grande inimigo é o sistema capitalista de produção. É fato que foi o homem branco que aqui pisou em 1500, trazendo a violência e a opressão, mas também é fato que este invasor foi a ponta de lança para a instalação das bases do capital nas terras de Pindorama. E, hoje, é o capital aquele que avança sobre as terras, buscando mais e mais acumulação. A unidade dos povos originários com os trabalhadores que lutam por outra maneira de organizar a vida é fundamental para construir esse novo Brasil, do qual falou Sônia na sua posse. “Nunca mais o Brasil sem a gente”, ressaltou, mas também reverenciou pessoas não-indígenas, como o jornalista Dom Phillips e Bruno Pereira, assassinados na Amazônia, por fazerem parte desse grupo que luta junto com os povos originários, atentos às suas particularidades, mas sem perder a relação com o todo. Anielle Franco, irmã da vereadora Marielle Franco, assassinada por milicianos no Rio de Janeiro, que assumiu o Ministério da Igualdade Racial também fez um discurso forte sobre a situação da população negra no Brasil, sempre excluída e massacrada desde a chamada abolição, e como Sônia também convidou os não-negros a caminharem juntos na construção de um país sem racismo e bom de viver. Uma caminhada de trabalhadores e trabalhadoras capazes de mudar o sistema, e não de apenas amansá-lo. Porque o capitalismo tem seus hábitos alimentares inamovíveis, o que inclui destruir a vida daqueles que têm apenas o seu corpo e a sua força de trabalho para vender, e dos que ainda conseguem viver de maneira solidária e cooperativa. São hábitos que não mudam, ainda que o discurso pareça domesticado. Não dá para se enganar. Não há “inclusão boa” no capitalismo. Não dá para negar que esse é um momento importantíssimo para os indígenas e para os negros, historicamente apartados do centro das decisões, e é preciso celebrar. Mas, não pode ser unicamente um espetáculo cheio de emoções. Ele é um momento tático de uma estratégia maior, que é a construção do chamado mundo novo, e por isso precisa ser também o fortalecimento de uma aliança inquebrantável do povo trabalhador, dos pequenos camponeses, quilombolas, ribeirinhos, indígenas, ciganos e toda a gente que enfrenta a sanha do capital avançando sobre suas terras e sobre suas vidas. O inimigo é o capital. E é tempo de destruí-lo. O Ministério dos Povos Originários Os trabalhadores e os indígenas Terras indígenas são estratégicas contra mudanças climáticas, defende deputada Joenia Wapichana

Os trabalhadores e os indígenas

A luta dos povos indígenas nunca teve trégua desde a invasão portuguesa aqui nas terras de Pindorama. Primeiro foi a tomada do litoral, depois as bandeiras foram se espraiando pelo interior. Por fim, a Amazônia. Onde havia ocupação tradicional, os invasores foram “limpando”, o que significava, obviamente, extermínio. Até o início do século XX foi assim e foi o Marechal Rondon quem procurou mudar isso, “morrer, talvez, matar, nunca”. Claro que ele ainda estava carregado da ideia de que era preciso integrar os indígenas à sociedade nacional, mas já era uma mudança abissal no trato com as etnias.  Foi ele quem criou o Serviço de Proteção ao Índios (SPI), hoje Funai. A ideia era essa mesmo, proteger. Pois esse conceito de proteção foi totalmente alterado agora no governo Bolsonaro. A Funai, que deveria cuidar e assistir os povos originários, passou a fazer vistas grossas para os ladrões de madeira, os mineradores ilegais e os fazendeiros invasores de terras indígenas. Violências de todo tipo, violações de mulheres e assassinatos de indígenas cresceram demasiado, sem uma intervenção contundente do Estado. Por isso que muitos trabalhadores da fundação, que insistiam em fazer o trabalho para o qual a Funai foi criada, passaram a sofrer perseguição e viver sob ameaças. Bruno Pereira, assassinado junto com o jornalista Dom Phillips, era funcionário da Funai e foi exonerado justamente porque denunciava os criminosos que sistematicamente invadiam terras indígenas. Bruno e Dom eram dois homens brancos que amavam a floresta e os povos da floresta. A vida deles, em atos e palavras, foi testemunha disso. Assim como eles, muitos outros – homens e mulheres – já tombaram naquela região, vítimas da ação de jagunços a soldo de fazendeiros ou de mineradores. São os desgraçados da terra que se transformam em algozes dos que defendem a vida da floresta. Gente que recebe uns 30 dinheiros para “limpar” as terras para que elas passem a abrigar soja, gado ou vire buraco de mineração. As terras indígenas são ricas e abrigam uma biodiversidade preciosa. Uma olhada rápida no Google Earth e já se pode ver que onde tem gente originária, tem preservação. É porque os povos indígenas não separam seus corpos vivos da natureza que os guarda. É tudo uma coisa só. Simbiose, equilíbrio. E são poucos os que, não sendo indígenas, conseguem compreender essa relação. Dom, como jornalista, acostumado a narrar o mundo, compreendeu e se fez amigo dos povos da floresta, procurando mostrar a realidade daquele mundo. Bruno, como trabalhador do Estado, também compreendeu. E foi além, ele ainda mergulhou na cultura e era capaz de falar até quatro línguas originárias diferentes. Ele era parceiro na proteção e no cuidado. Era um amigo e visto como tal. Não é coisa fácil isso. Os povos indígenas são bem desconfiados e há aqueles que não aceitam muito qualquer contato com gente branca. Tem uma memória aí de mais de 500 anos que é difícil de apagar. O invasor era branco e ainda são brancos os que seguem sendo os mandantes dos crimes, dos sistemáticos crimes que são cometidos contra os indígenas. Mesmo que os assassinos sejam caboclos, a mão que manda é branca. E eles sabem. O fato é que a mão que manda matar é a mão do capital. O assassino de Bruno e Dom é o capital. O assassino de Chico Mendes, Irmã Dorothy e de outros tantos lutadores sociais que decidiram se aliar à luta indígena é o capital. Esse sistema que, por sua natureza, é voraz e destruidor e que não se furta a eliminar qualquer um que se coloque no seu caminho de acumulação. Nesse país, onde 13% do território está sob o controle dos povos originários, faz-se mais do que necessária uma aliança entre os trabalhadores e os povos indígenas. Essa é uma luta que se insere na luta de classes, a batalha dos despossuídos contra o capital. Nessa guerra, trabalhadores urbanos, do campo, ribeirinhos, quilombolas, populações tradicionais estão todos no mesmo lado. A vitória de um desses segmentos é a vitória de todos sobre o capital. E, juntos, conformam maioria. Bruno e Dom entenderam isso e estavam fazendo sua parte. Mas, essa precisa ser uma ação coletiva, e de massa. Porque na solidão, os riscos são sempre maiores, como se viu. Não é fácil fazer vingar essa unidade. Mesmo entre os trabalhadores muitas vezes é dificultoso o entendimento sobre as necessidades particulares dos povos indígenas. Ainda há que abrir estradas nessa difícil relação. Lembro-me de um grupo de estudos criado no IELA/UFSC, com estudantes indígenas, no qual uma das garotas defendeu não estudar a obra de Darcy Ribeiro, por ele ser branco e não ter “lugar de fala”. Ora, Darcy foi um homem branco que viveu sua vida inteira estudando e defendendo os povos originários num tempo em que quase não havia entidades indígenas organizadas. Ele tem um lugar na história. Não é sua cor que define sua ação. É o lado que ele ocupou na luta contra o capital – que é o inimigo comum. E assim como ele, Bruno, Dom e tantos outros companheiros e companheiras que não medem esforço para denunciar os que pretendem exterminar os povos indígenas e que se colocam nas fileiras de luta junto com os indígenas nas marchas, atos e manifestações pelo Brasil afora. Há um longo caminho de construção de unidade entre trabalhadores e indígenas e há muita incompreensão e desconfiança em ambos os lados. Mas, exemplos como o de Bruno e Dom mostram que é possível uma relação de confiança e de amizade na luta contra o capital, que se concretiza nos fazendeiros, mineradores, ladrões de madeira, governantes corruptos, empresários e transnacionais. Quando isso for entendido, a luta coletiva derruba o capital. O histórico Ministério dos Povos Originários O Ministério dos Povos Originários Indigenista Ricardo Rao conta como escrachou Marcelo Xavier https://urutaurpg.com.br/siteluis/nos-jornalistas-temos-uma-divida-com-bruno-e-dom/ Segue o massacre aos povos indígenas Governo Bolsonaro agrava a violência contra ativistas

Câmara aprova urgência para projeto de destruição das terras indígenas

Indígenas Brasil – O governo brasileiro segue firme no seu intuito de entregar as terras indígenas, que conformam 12% do território brasileiro, para mãos privadas, preferencialmente o agronegócio e a mineração. Ou seja: não basta pegar, tem que destruir. Desde que assumiu o mando do país, Jair Bolsonaro ataca os povos indígenas com o argumento de que não dão lucro para a sociedade e que, por isso, precisam ser “integrados” para se transformarem em trabalhadores. Com essa lógica, o governo desmontou a Funai (órgão que deveria proteger os indígenas) e tem feito vistas grossas para todos os ataques de grileiros, jagunços e fazendeiros nas terras indígenas. A mineração clandestina segue a todo vapor e nem poderia mais ser chamada assim, já que se faz sem pejo, à luz do dia. O número de ataques às comunidades aumenta, bem como os registros de assassinatos e violências de todo o tipo contra os indígenas, sem que haja uma política para coibir. A presença de igrejas neopentecostais nas aldeias e comunidades também tem sido uma grande aliada do governo no processo de desagregação dos povos indígenas, pois com a “evangelização”, as populações vão abandonando sua cultura e suas crenças. Em muitas comunidades, já não se cantam mais os cantos sagrados e as práticas de cura vão sendo esquecidas. Na última semana, no Mato Grosso do Sul, numa aldeia Guarani, registrou-se o sequestro de uma mulher acusada pelo chefe da comunidade, de nome Antônio, de feitiçaria. As cenas registradas em vídeo mostram o homem ofendendo, acusando, cortando o cabelo da mulher e ameaçando de colocar fogo nela, coisa que teria sido feita caso não tivesse outro grupo resgatado a curandeira. Um momento dramático da nossa história recente, mostrando o tanto de mal que essas igrejas, carregadas de intolerância, fazem na vida dos povos indígenas. Mas, se o presidente quer acabar com a vida indígena, ele não está sozinho nessa empreitada. A Câmara de Deputados, que conta com 513 membros, está majoritariamente na parceria. Nesse dia 9 de março, por exemplo, aprovou regime de urgência para o PL 191, de autoria do Executivo, que regulamenta a mineração em terras indígenas, inclusive onde vivem povos isolados, sem que as comunidades originárias tenham direito a veto. Com a urgência, o projeto não passará por comissões ou debates e será levado imediatamente ao plenário. No mesmo momento em que um ato gigantesco contra o PL acontecia na frente do Congresso Nacional, reunindo indígenas, movimentos sociais e artistas, a proposta passou sem rugosidades, com 279 votos a favor, 108 contra e três abstenções. Apenas as bancadas do Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido do Socialismo e Liberdade (PSOL) votaram em peso contra a urgência. Outros partidos como o PDT e Novo racharam e cederam votos para o governo. O argumento para a urgência não poderia ser mais hipócrita. O presidente diz que agora, com a guerra na Ucrânia, o Brasil precisa ficar mais independente da importação de potássio, daí a necessidade de liberar a mineração do potássio nas terras indígenas. Sim, esse é o argumento. E foi acatado sem críticas por 279 deputados. Agora, o PL deverá ser votado até o dia 14 de abril e, a considerar o perfil do legislativo, provavelmente será aprovado. A mobilização contra o PL 191, que levou milhares de pessoas a Brasília no “Ato pela Terra contra o Pacote da Destruição”, foi pacífica e tranquila, não conseguindo tocar o coração dos deputados. O que não foi nenhuma novidade visto que não é por aí – o coração – que eles se movem. São os interesses financeiros dos grupos que os elegeram que definem os votos. E, no Congresso Nacional, há apenas uma indígena no universo de 513 membros. A deputada Joenia Wapichana se manifestou em plenário dizendo que o projeto em questão representa o sonho de Bolsonaro que é de destruir completamente os povos indígenas no Brasil. Mas, também lembrou que as comunidades estão organizadas e vão lutar. Esse processo não vai se dar na paz. Até porque desde o primeiro dia de governo de Jair Bolsonaro, quando uma de suas primeiras medidas foi tirar a Funai do Ministério da Justiça, jogando-a para o Ministério da Agricultura, os povos indígenas têm se levantado em protesto e vêm realizando marchas, atos e manifestações no país e fora dele, pedindo ajuda da sociedade para que atuem em comunhão visando proteger as comunidades que mais protegem a biodiversidade e as florestas. Num país tão grande como o Brasil, não serão os 12% do território que irão empobrecer a nação caso não estejam produzindo soja ou minerais. O que as pesquisas mostram é que são justamente esses 12% nas mãos indígenas que têm garantido a proteção da natureza, tão necessária para evitar tragédias ditas “naturais”. Agora, com o pedido de urgência do projeto de lei aprovado, os povos indígenas terão menos de um mês para novas movimentações. Nesse sentido, é mais do que necessário o engajamento de entidades não-indígenas, dos sindicatos, dos movimentos sociais nessa batalha contra a mineração em terras indígenas. Afinal, esse processo grotesco não apenas destrói o lugar onde abre suas crateras, mas a mineração também mata os rios, a fauna e as pessoas.  Pode parecer que está distante da maioria, mas não está. É justamente essa destruição sistemática dos ambientes que provoca tantos desastres nas cidades e nos campos, como enchentes, secas, temporais fora de época e tudo mais. A regra é clara: não se toca na asa de uma borboleta sem que estremeça o planeta inteiro. Todos à luta contra o PL da morte e da destruição. Mineração ameaça terras indígenas Terras indígenas são estratégicas contra mudanças climáticas, defende deputada Joenia Wapichana Mulheres indígenas lutam pelo futuro em Brasília Terras indígenas são estratégicas contra mudanças climáticas, defende deputada Joenia Wapichana  

Rolar para cima