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Política análise

Análises de nossos colaboradores sobre a conjuntura política.

Dois toques sobre a eleição no Brasil

Eleições 2022 – Antes da eleição eu estava sentada lá no Elias, comendo um pastel. Sentou ao meu lado um homem e logo puxou conversa perguntando em quem eu iria votar. Não era um homem sem cultura formal, era um brasileiro médio, pequeno empresário e bem articulado. Respondi que não sabia ainda, para dar corda. Ele então começou a falar sobre as propostas da “esquerda”. Uma delas era que o Lula, se eleito, iria transformar os banheiros das escolas em banheiros conjuntos, meninos e meninas junto. E que aquilo era um absurdo. Também que nas escolas iriam ensinar como ser gay e puta, estragando a família brasileira. Disse ainda que as vacinas que as pessoas tinham tomado eram feitas de placenta humana e que causavam câncer em massa. Que o Bolsonaro estava certo em não querer que a população se vacinasse, que ele salvou vidas. Falou da ministra Damares e no quanto ela estava trabalhando para proteger as meninas de tanto pecado. Sobrou até para o Papa Francisco, que, segundo o cara, era um pedófilo convicto e que, unido com a esquerda, iria perverter todas as crianças. Disse ainda que o comunismo era a coisa mais horrível do mundo, embora não conseguisse me explicar em que exatamente consistia. O que ele sabia era que destruía a família. Por isso a necessidade de escolas militares. Além disso, falou do quanto o Lula era ladrão e do tanto que tinha roubado o país. Por isso era fundamental que a população estivesse armada, para se proteger da violência e dos ladrões. Também afirmou convicto que as queimadas na Amazônia e no Pantanal tinham sido provocadas por esquerdistas aliados ao Leonardo DiCaprio, para manchar o nome de Bolsonaro. Por fim, para salvar a família, só mesmo o Bolsonaro. Estas são algumas das verdades que estão firmes na cabeça de um número expressivo de brasileiros. São ideias que cruzam o éter nos grupos de família, de amigos, na igreja, nas conversas de bar. O comunismo é do diabo, torna as pessoas marginais e por isso é preciso acabar com essa ideologia satânica. Se precisar, para dar fim no comunismo é preciso acabar fisicamente com os comunistas. Eles são a maçã podre que está enfraquecendo a nação e a família. Eles são monstros que realizam sacrifícios humanos para se manter no poder no mundo. Tudo o que dá errado no país é culpa deles. Eles causam os problemas para incriminar Bolsonaro. Por isso a cruzada do presidente e de sua religiosa esposa. Eliminar os comunistas é salvar a nação. E as pessoas falam isso sem qualquer pejo. Porque para elas matar um comunista não é crime, é ajudar na missão de deus para criar um país seguro para seus filhos. Por isso acreditam na ideia de que os militares, quando deram o golpe em 1964, estavam corretíssimos em perseguir, torturar e matar os comunistas. Porque eles são a causa de todo o mal. Esse tipo de discursos não está apenas no âmbito das pessoas mais simples e religiosas. Ele circula velozmente mesmo entre os letrados. Tem se transformado numa espécie de monstro que carrega todo mal do mundo. E não adianta querer argumentar, trazer elementos da história. Não. É crença. Não está no campo da razão. Qualquer tentativa de debate é rechaçada com um olhar estranho de reconhecimento: ela é o diabo. Já ouvi isso até mesmo de pessoas da família, pessoas muito próximas. E esse reconhecimento implica em uma ação imediata de rechaço e de necessidade de eliminação. Assim que não adianta trazer números sobre o quanto a ditadura matou e torturou. Para essa gente, os milicos fizeram o que tinham de fazer e, se precisar, eles mesmos o fazem agora. Tudo para salvar a família. Não há argumento que penetre esse muro criado pela fé cega. É nesse mundo que estamos agora. E, de certa forma, perdidos. Porque o que se vê no campo da esquerda é uma incapacidade teórica e prática de atuar nesse universo. Primeiro que há uma negação sobre esse discurso e uma desqualificação das pessoas que o disseminam. Não sei se é o caminho. A política está atravessada pela moral, sempre esteve de algum modo quando definimos o que é bom ou o que é ruim. Mas, agora, nesses tempos, a moral se sobrepõe porque a política – tal como aparece – tem se mostrado incapaz de dar respostas aos problemas cotidianos. Geralmente quem tem feito isso – dar respostas e caminhos – é a igreja. As neopentecostais estão em cada esquina, como as farmácias. E elas são espaços onde as pessoas se sentem seguras para sonhar com a resolução dos problemas. Então, entregar a vida nas mãos de deus parece ser o mais seguro. E quem é o homem de deus? Bolsonaro. Então, quem está com ele, está com deus. Por isso, um completo desconhecido, com uma arma na mão, pode virar o senador eleito de um estado, como aconteceu em Santa Catarina, porque ele é um soldado de deus para acabar com os bandidos e defender a família. Esse é o mantra. “Deus no controle”, e não um deus qualquer, mas um deus vingador, sedento de sangue. E os comunistas é que são os satânicos. Ah, mas claro. Eles estão a serviço do diabo. Por isso devem ser eliminados. Simples assim. Elementos da realidade do governo de Bolsonaro tais como a compra de imóveis de luxo com dinheiro vivo, corte de 92% da verba para Ciência e Tecnologia, aumento dos salários do presidente, do vice e dos generais em 69%, mais de trinta bilhões de orçamento secreto, cinco bilhões para o Fundão eleitoral, cinco milhões para os desfiles de moto, pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), desvio de verbas de combate à Covid, retirada de recursos das Universidades, fim de direitos trabalhistas, invasão das terras indígenas, e outros tantos, não são considerados. Isso não é considerado problema pela maioria da população. E é nesse ritmo que a realidade perde força diante da fé. Se os preços dos

Por que tanto medo?

    Medo da violência política – Nas campanhas políticas anteriores, desde a redemocratização em 1985, adesivos e cartazes de candidatos eram vistos afixados em veículos, lojas e domicílios. Havia bandeiras de partidos expostas do lado de fora de apartamentos e à frente de casas. Carreatas percorriam as principais vias das cidades exibindo propaganda dos candidatos. Agora, quem ousa afixar em seu carro um adesivo eleitoral, exceto em atos com grandes concentrações? O que resta é a propaganda eleitoral no rádio e na TV e nos comícios de candidatos majoritários. Nem parece que o destino de 215 milhões de brasileiros será decidido em poucos dias por 156 milhões de eleitores. Os candidatos ao Legislativo ousam mostrar a cara, promover eventos de campanha, sair às ruas em busca de votos. Querem ser cada vez mais conhecidos. Mas o fazem cercados de cuidados. Sabem que correm o perigo de agressão física e, quase sempre, entre aplausos e apoios, escutam uma ofensa ou injúria. Mas não lhes resta alternativa senão enfrentar o risco. Os candidatos a cargos majoritários são mais cautelosos. Contam com a proteção de forças policiais e adotam esquemas profissionalizados de segurança. Em concentrações públicas, o público é revistado e a segurança reforçada. Fora momentos de campanhas e propaganda radiotelevisiva, há poucos indícios de que o Brasil irá às urnas em poucos dias. As pesquisas indicam que o eleitorado já sabe em quem votar, e o número de brancos e nulos tende a decrescer. Mas o eleitor parece retraído quando se trata de batalhar por seus candidatos. Nas redes digitais, as campanhas correm soltas e o clima de guerra se acentua, agravadas pela avalanche de fake news e tentativas de ridicularizar adversários. O espaço virtual se aquece; o presencial arrefece. Esse clima eleitoral inusitado se deve à cultura miliciana que paira sobre a população brasileira como uma nuvem densa e pesada a ameaçar dilúvio. O ar que respiramos está impregnado de belicismo. Teme-se, não uma palavra ofensiva do adversário, mas uma facada ou um tiro. É a banalização do mal. Ou melhor, a bolsonarização da violência. Esta é a campanha eleitoral do medo. O medo é uma reação involuntária em prol de nossa sobrevivência. Temos medo de assalto e, por isso, não caminhamos solitários por determinadas ruas à noite; o medo de atropelamento nos faz esperar o sinal fechar; o medo de um cão nos impede de entrar em uma casa enquanto ele estiver solto. Nosso medo é que o Inominável seja reeleito e, assim, acelere o desmonte do Estado brasileiro e fortaleça o comércio de armas, o garimpo ilegal, a impunidade a quem desmata nossas florestas. Medo de um arremedo de democracia militarizada, de forças de segurança agindo ao arrepio da lei, de mulheres, negros e indígenas prosseguirem vulneráveis à ação cruel da supremacia machista e racista. Medo de que a fome prospere e a desigualdade social se agrave. O medo é uma sensação de insegurança, pavor ou repúdio diante de uma pessoa, um objeto ou uma situação. Quando temos medo, nosso cérebro produz substâncias que disparam o coração, tornam a respiração ofegante, contraem os músculos. Como perder o medo? Só conheço um antídoto: quando aquele ou aquilo que se ama tem, a nossos olhos, um valor acima de nossas próprias vidas. Pode ser uma pessoa, uma causa, um ideal ou até mesmo uma utopia. É o que imprime coragem frente uma situação de ameaça. E o que está em jogo nesta eleição não é a minha vida, é a vida de um povo, a independência de um país, a soberania de uma nação, a conquista da democracia. No 7 de setembro o bicentenário de Independência foi jogado para escanteio e o que se viu foi um escandaloso uso da máquina pública, com dinheiro do contribuinte, para tentar alavancar o candidato que ora ocupa o Planalto. Ele, que tanto prometeu golpe na data, recuou. Faltaram-lhe apoios internacional e do grande capital nacional. Restringiu-se a aglomerar supostos apoiadores (sei de funcionários que votam Lula, mas embolsaram calados o dinheiro extra dado pelo patrão e compareceram) e suscitar em coro um refrão chulo digno de cervejada miliciana: “Imbrochável!”, enlameando a família brasileira que ele diz tanto defender e respeitar. Chegou a hora de dar um Basta! Pelo voto haveremos de manifestar nossa vez e voz em prol de um Brasil sem medo de ser feliz. Publicado originalmente no Correio da Cidadania. Meus votos a presidente Governar pelo medo Sobre a democracia e o voto

Comida no prato ou no tanque de combustível?

Fome – No Brasil, passa de 30 milhões o número de pessoas com fome crônica. Como admitir que um país, com um território tão vasto e fértil, que colhe cerca de 270 milhões de toneladas de grãos na safra 2021/2022 (1,3 tonelada por habitante), possa ter índices tão alarmantes de famintos? E são mais de 100 milhões de habitantes em insegurança alimentar. No mundo, a fome ameaça a sobrevivência de quase 1 bilhão de pessoas. Por quê? O preço do trigo se manteve estável nos últimos 30 anos. As safras de 2020 e 2021 foram boas e os estoques, suficientes. O problema é que, muitos países, sobretudo na África e na América Latina, são fortemente dependentes de bens alimentares, como cereais e óleos vegetais, produzidos por Rússia e Ucrânia. A guerra afeta duramente a produção e a exportação, e deixa os importadores sem alternativas viáveis. A inflação dos preços dos alimentos no mundo não é propriamente consequência do conflito entre ucranianos e russos. Teve início nos primeiros meses de 2020, quando houve aumento dos preços de petróleo e gás. Quando as ações das empresas de gás e petróleo subiram nas Bolsas de Valores, sinalizou-se que o preço dos alimentos teria alta. E o nosso sistema alimentar é muito dependente desses combustíveis, sobretudo na produção de pesticidas e fertilizantes, e em transporte, processamento e conservação dos produtos. Quanto mais sobem os preços dos combustíveis fósseis, considerável parcela de produtos agrícolas deixa de ser destinada ao consumo humano para gerar biocombustíveis. E a Bolsa de Chicago, que regula os preços dos alimentos, favorece a especulação ao taxar a cesta que associa petróleo, gás e minerais a produtos agrícolas. O agronegócio, tão aclamado pelo capitalismo, produz hoje menos para alimentar pessoas e mais para abastecer veículos e gerar eletricidade. Os principais biocombustíveis produzidos no Brasil são o biodiesel e o etanol. O biodiesel deriva de oleaginosas (mamona, algodão, amendoim, dendê, girassol e soja) e de matérias-primas alternativas, como gordura animal, óleos de frituras e gorduras residuais. Em 2020, a produção brasileira de etanol foi de 32,6 bilhões de litros, um decréscimo de 9,5% em relação a 2019. A produção de açúcar apresentou aumento de 39%, alcançando 41,5 milhões de toneladas, e suas exportações cresceram 13,9 milhões de toneladas (acréscimo de 71,7%) – dois recordes históricos. O setor sucroenergético processou 663 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, 1,3% superior ao ano anterior (MAPA, 2021). A produção nacional de etanol de milho quase duplicou, alcançando 2,4 bilhões de litros em 2020, aumento de 82%. Para a safra 2021/22, espera-se redução na moagem de cana, devido à seca em algumas regiões e à diminuição da área de plantio pela concorrência com alguns cultivos, como soja e milho, que têm tido boa rentabilidade. O desafio, hoje, é buscar um sistema alimentar que dependa cada vez menos de combustíveis fósseis e adote práticas agrícolas regenerativas e sustentáveis, como a agroecologia, de modo a reduzir a dependência de insumos externos e aumentar o preservação do meio ambiente. Devemos nos empenhar em depender cada vez menos das multinacionais que controlam o comércio de alimentos no mundo. Para isso, é preciso valorizar as agriculturas familiar, urbana e suburbana. Aproveitar cada pedaço de terra – um lote, um terreno baldio, um quintal – para semear alimentos. Fortalecer a conexão entre campo e mesa, livre da intermediação especulativa. Todo esse processo depende muito da educação nutricional. Sem mudanças de hábitos alimentares, valorização da agricultura familiar e canais alternativos de abastecimento de feiras livres e supermercados, a sociedade continuará refém dos que tratam os alimentos como mero valor de troca, e não valor de uso. A educação alimentar nos ensina a abandonar o consumo de alimentos ultraprocessados, desprovidos de valor nutritivo, e evitar o desperdício. Alimento é fator de comunhão, comum união, entre familiares e amigos. E, hoje em dia, há microapartamentos sem fogão, com apenas um micro-ondas para aquecer as refeições que já chegam prontas. É preciso vencer todos esses obstáculos à boa alimentação e resgatar o seu valor de nutrição e comunhão. Caso contrário, a saúde do planeta e de vidas humanas estará cada vez mais prejudicada. Publicado originalmente no Correio da Cidadania. Combater a fome e o veneno na alimentação Retrocesso: efeitos de quatro anos de governo Bolsonaro no Brasil  

Sobre a democracia e o voto

Democracia e voto – A democracia, já sabemos com Lenin, não pode ser um termo abstrato. Ela precisa ser adjetivada. Por isso que falar em democracia serve a todos. Como se só ao pronunciar essa palavra mágica já se compreendesse liberdade, participação etc… Não é assim. Basta a gente ver o que entende por democracia o governo dos EUA, por exemplo: para ele, democracia é o que está alinhado com seus interesses, aos interesses de sua classe dominante. O mesmo acontece no Brasil. Quando a gente ouve os políticos falarem em democracia é preciso perguntar: que democracia? A que serve ao capital? Aos grandes empresários? Às transnacionais? Ao agronegócio? Aqui no nosso país as pessoas entendem a democracia como sinônimo de votar. Ora, essa é uma das facetas da democracia. Mas não é só isso. Votar a cada dois anos em pessoas que nos representarão nos espaços legislativos e executivos não significa liberdade e participação. E por que eu digo isso? Porque o resultado é nítido na formação das bancadas e dos governos. O que temos por aqui é a ditadura do capital. É o poder econômico que determina a formação desses espaços. E isso fica bem claro quando a gente reconhece, por exemplo, que existe uma Bancada do Boi (que representa o agronegócio), ou uma Bancada da Bíblia (que representa os interesses dos pastores das igrejas neopentecostais) e assim por diante. Cadê a bancada dos trabalhadores? Não tem. É um ou outro lá dentro do Congresso que defende os interesses da maioria da população. O restante está a serviço da classe dominante e seus interesses. Hoje, ouvindo a propaganda política no rádio ouvi um candidato a senador dizer: “Eu vou representar os interesses do Estado de Santa Catarina”. Eu pensei. Bom, esse, pelo menos não mente. Diz logo que vai representar os interesses do Estado e não das pessoas. E o que é o Estado? É o balcão de negócios da burguesia! Logo, ele não vai para Brasília defender os nossos interesses, de trabalhadores. Não. Vai defender os interesses dos empresários, dos fazendeiros, dos ricos. E há os que falam em defender os interesses da família. Esses também são honestos. Defendem os interesses de suas famílias. Vocês devem conhecer bem os tipos aí… Por isso que nessa hora de votar – que é só um dos momentos dessa nossa democracia manca – a gente deveria ter mais cuidado. Observar as promessas. A pessoa vai defender o quê mesmo? Qual é a sua prática cotidiana? Se já foi parlamentar ou governante, o que defendeu e o que fez? E vejam bem, não basta terem feito grandes obras. Há que ver o que fizeram para tornar a vida da maioria dos trabalhadores melhor. O que fizeram pela educação das massas, pela saúde, pela segurança, pelo direito de morar dignamente, pelos direitos dos trabalhadores? Hoje, com a internet, as informações estão bem aí. Basta dar um tempinho do tiktok e procurar no google. Existem palavras que escondem outros sentidos, tais como a democracia, por exemplo. Mas os atos são limpos como a água da fonte. A pessoa votou como na hora de defender os direitos dos trabalhadores? E votou como na hora de defender o patrimônio público nacional? E votou como na hora de decidir sobre o pagamento da dívida externa?  Os atos gritam. Siga o grito… Não é sem razão que os chamados “democratas” têm tanto medo da ditadura do proletariado. Porque ela significa que quem manda é a maioria trabalhadora, 99% da população. Enquanto que na ditadura do capital, quem manda é o 1%, uma fatia muito pequena da população que se apropria da riqueza e joga a maioria na escassez.  Vejam que aí a ditadura também precisa ser problematizada. Então, o que podemos fazer nessa nossa democracia fraca, que só nos permite o voto a cada dois anos, e ainda totalmente comandado pelo poder financeiro, é prestar bem atenção em quem vamos colocar nos espaços de poder. Alguém que vai defender o estado? Os grupos tradicionais de poder, a classe dominante? Os empresários? Os fazendeiros? Os pastores? Ou vamos votar em quem está verdadeiramente do lado da maioria, dos trabalhadores, dos oprimidos, dos desvalidos, dos 99%? A democracia participativa é mais do que votar. É participar de tudo o que diz respeito à vida das cidades, dos estados, do país, com poder de decisão. Isso, claro, só se consegue com luta, com revolução. Mas, enquanto ela não chega, o mínimo que podemos fazer é garantir que dentro dos atuais espaços de poder – onde mandam os interesses da classe dominante – tenha uma grande bancada nossa, dos trabalhadores, para fazer barulho, para fazer pender a balança a nosso favor.  Hoje,  tanto nas Câmaras de Vereadores, quanto nas Assembleias, Câmara de Deputados e Senado, estamos muito fracos. Mas muito fracos mesmo. Sem qualquer chance de fazer estremecer o poder dos grandotes. Isso tem de mudar. Então pensa bem na hora de colocar seu voto na urna. Vais votar em quem te ferra? Ou vais votar em quem realmente te representa e defende os teus interesses? Seria bonito ver os trabalhadores tendo uma poderosa bancada. Já basta de defender patrão. Já basta de defender fazendeiro, banqueiro, pastor.  É hora de virar o leme na direção de uma vida digna para a maioria dos trabalhadores. Breve crítica da democracia louvada As eleições e as opções dos trabalhadores Por que tanto medo?

Lula no covil do pato

Lula na Fiesp – Dia de sabatina de Lula na Fiesp. Chego por volta das 10 horas da manhã com meu único blazer na portaria do prédio do covil do pato, sou encaminhado para o décimo oitavo andar. A turma de assessoras me indica uma vaga “para jornalistas de texto”, segundo uma delas, em sala com microfones individuais e dois telões nos cantos. Estou no meio de vários jovens repórteres da grande imprensa, pela estica, suponho que da editoria de Economia e Política. Como havia uma bancada com vários lugares supridos de cadeiras de escritório na nossa frente, me iludi que a sabatina seria ali há três metros. Não. Seria no telão mesmo. Aos poucos, em corredor na lateral da sala, protegidos por seguranças e agentes da Polícia Federal, comandados por loira de meia idade, começam a passar empresários e políticos. Passam Alckmin com seu sorriso amarelo, Haddad com cara de galã de novela mexicana, Celso Amorim, Mercadante e outros do baixo clero petista. Na cola deles, empresários grudados em seus ouvidos simulam proximidade. No meio deles, velho de óculos cambaleia. “Será que já entornou uns goles de blue label no desjejum”, penso. E nada do Lula! Lula surge no telão em longa mesa com sua trupe petista no meio de apoiadores do impeachment em sua maioria, suponho, tanto na mesa como na plateia de cerca de 300 pessoas. Josué Gomes da Silva abre os trabalhos. Alçado à presidência da FIESP pelos seus pares neste ano. Josué foi eleito em julho de 2021 e seu mandato vai até 2025. Sua fala pode ser resumida em pedido de reforma tributária e a necessidade do aumento do índice de crescimento da economia e do fortalecimento da infraestrutura do país. A novidade está na preocupação com o desenvolvimento sustentável. “Como podemos viver em um país em que o presidente conta 7 mentiras todo dia e chama uma carta que defende a democracia de ‘cartinha”, Lula na Fiesp sobre a Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito, que contou com 1 milhão de assinaturas. Pulemos as falas mornas de Aloizio Mercadante, coordenador do programa de governo de Lula, e do candidato a vice-presidente Geraldo Alckmin, e vamos às palavras de Lula, o filé mignon do dia, como aquele servido pela FIESP aos manifestantes pró-impeachment em 2016 por Paulo Skaf, ex-presidente da entidade. Já no início, Lula compara o relevante papel do vice-presidente José Alencar, pai de Josué, que governou com Lula por 8 anos, com o protagonismo que será dado a Alckmin em possível terceiro mandato. Antes, Josué já havia elogiado o antigo governador paulista. “Ele sempre teve grande carinho por essa casa”. Durante o discurso, Lula apelou aos sentimentos de Josué e lamentou a morte de José Alencar, pai do presidente da Fiesp. “Ele (José Alencar) sonhava em consertar esse país, parecia uma criança”, afirmou Lula. No final, Lula ainda lembrou que seu ex-vice falava que Josué era um gênio. Na longa fala de Lula, o ex-presidente abordou dois assuntos polêmicos: o apoio da Lava Jato pelos empresários e o sucateamento da indústria brasileira/domínio chinês nesse setor.   Lava-jato Lula subiu o tom da voz quando discursou sobre como a Lava Jato prejudicou parte da indústria brasileira. Segundo ele, “o fedelho Dallagnol encheu a cabeça de vocês de mentiras”. Lula questionou os empresários sobre a destruição do setor de engenharia brasileiro e afirmou que o Brasil batia de frente com as empresas norte-americanas nesse setor. Ele ainda afirmou que o setor de construção brasileira atuava em grandes obras tanto na África como no mundo árabe e que isso tudo foi destruído pela Operação Lava Jato. Acusou os integrantes da Lava Jato de terem feito acordos com o Departamento de Justiça norte-americano que prejudicaram o país. “A História um dia vai contar tudo, vamos esperar. Hoje eu ando de cabeça erguida”, finalizou.   O gigante chinês “Os chineses se não ganharam tudo, ganharam quase tudo“, disse Lula ao iniciar a leitura de relatório que mostrou a participação da China na economia brasileira. 95% do mercado de fabricação de eletrodomésticos, 79% da fabricação de fibras óticas 77% em equipamentos de comunicação 65% em componentes e placas eletrônicas Lula elencou mais alguns mercados dominados por chineses e brincou: “vou parar que vocês vão querer declarar guerra contra a China” O ex-presidente afirmou que A China está ocupando o Brasil e fabrica hoje produtos que a indústria brasileira fabricava com qualidade e voltou a falar de seu vice. “José Alencar não tinha medo da China”. O entrevistado Zonacurva, o professor Elias Jabbour, analisa o discurso de Lula na Fiesp sobre a China:   Principais trechos do discurso de Lula no covil (9 de agosto de 2022): “O Brasil não conversa com ninguém, nem o presidente é convidado a ir lugar algum e ninguém vem aqui, esse país precisa reestabelecer uma certa normalidade”, Lula sobre política internacional.   “A solução do Brasil é o povo pobre, na hora que a gente colocar o pobre no orçamento da União, na hora que o povo virar consumidor e comprar um leite a mais, um sapato a mais (,,,), esse país tem jeito”, Lula e sua relação com os pobres se for eleito.   “Credibilidade, estabilidade e previsibilidade. São três palavras que devem fazer parte do dicionário de qualquer governante que quiser governar o Brasil“, Lula passando recado direto sobre as constantes crises criadas pelo governo Bolsonaro.   “Essa história de acreditar que o trabalhador quer que o empresário quebre é uma bobagem, ele é a primeira vítima quando o empresário quebra”, sobre conciliação entre capital e trabalho.   “Nunca vi a quantidade de desgraça nas ruas do Brasil como hoje”, Lula sobre a atual desigualdade social brasileira.   “A Europa precisa mais do Brasil do que a gente deles, mas tem que negociar com eles sem complexo de vira-latas, temos que ter gente que gosta desse país e saiba negociar”, Lula sobre o isolamento brasileiro no cenário internacional.   “Não aguento mais essa

Pedro Castillo e os dramas da política

Quando Pedro Castillo foi eleito presidente do Peru, a esperança era de que o país iria encontrar seu caminho no rumo da vida digna para a população, acossada por sucessivos governos corruptos tocados pelos representantes da classe dominante local, que. por sua vez. é capacho das empresas estrangeiras e países centrais. Castillo, um professor, sindicalista e lutador social, viria para apontar mudanças num país em escombros.  Mas, o que se vê é uma oposição disposta a não permitir que ele governe, tendo como aliada a mídia comercial que capricha nas campanhas propagandísticas contra o presidente. Desde a formação do seu primeiro gabinete de governo, a oposição vem colocando entraves, exigindo que determinadas pessoas não possam estar no governo. E o primeiro grande erro de Castillo foi ceder. Ao abrir mão de nomes de sua confiança por conta da resistência no legislativo, o presidente abriu um flanco que não para se de alargar. Já são cinco gabinetes diferentes formados. Desde julho de 2021, quando assumiu o governo, até agora ele vem sofrendo sucessivos ataques e tentativas de impedimento por parte do legislativo e da fiscalia nacional (órgão semelhante à Procuradoria). Acusado de trair a nação e de corrupção, tanto o Congresso quando a fiscal Patricia Benavides mantêm campanha cerrada na tentativa de tirar Castillo do poder. O fujimorismo – que ainda é forte – é o grande impulsionador da cruzada. Até agora já foram duas tentativas frustradas de impedimento no Congresso e cinco ações na Fiscalia da Nação, por isso os ataques começam a se fazer também na família do presidente, como a investigação contra sua filha Yenefer Paredes, também acusada de corrupção. Um juiz ordenou que se entrasse na casa do presidente com ordem de prender Yenefer. Foi um show midiático de grande potência e repercussão.  Jogada para enfraquecer e desqualificar Castillo. Tudo isso acontece no mesmo momento em que o Congresso dá início a outro processo pedindo a destituição do presidente do Peru. Lá, como cá, também teve apresentação de gráficos do Ministério Público, muito bem divulgado pela mídia local. Diante de mais esse ataque, Pedro Castillo falou no dia 9 de agosto ao povo peruano em cadeia nacional denunciando mais uma tentativa de desestabilização e pedindo que não se permita uma quebra constitucional, visto que os ataques seguem sem parada com o intuito de tirá-lo do governo. Enquanto tudo isso acontece, o presidente do Peru tenta colocar em prática algumas de suas propostas, mas tem sido difícil, visto que a maior parte do tempo precisa estar se defendendo dos ataques judiciais e parlamentários. Uma de suas principais promessas, que foi a de fazer uma nova Constituição, que sepultasse de vez o fujimorismo, morreu no Congresso. O projeto apresentado por Castillo foi arquivado. E, não bastasse isso, a crise econômica que se expressa em todos os países latino-americanos também faz estragos no Peru, provocando mobilizações e protestos contra o preço da gasolina e dos alimentos. A instituição de um estado de emergência e a repressão aos movimentos não tem ajudado muito o presidente, que vai se tornando impopular também entre os seus aliados. Para os mais empobrecidos, Pedro Castillo criou uma série de políticas públicas, entre eles o vínculo Wanuchay, uma espécie de bolsa-família, destinado aos pequenos agricultores (65 mil produtores de agricultura familiar) e os títulos Yanapay, para famílias sem renda, cerca de 13,5 milhões de peruanos. São medidas que dão algum fôlego para as famílias, mas como Castillo não consegue avançar nas propostas de mudança estrutural, acabam sendo apenas paliativas. Isso sozinho, não se sustenta. A batalha que hoje se trava no Peru é a da permanente inviabilização de qualquer proposta que venha do executivo, acompanhada de um sistemático ataque moral. Nas redes sociais, o que se vê são ataques à figura do presidente pintado como “ladrão” e “corrupto”, que é para colar nele a mesma etiqueta que levou às sucessivas quedas de presidentes anteriores. A “democrática” luta contra a “corrupção” não consegue apresentar provas, mas segue firme no campo simbólico. É fato que Pedro Castillo não tem uma formação sólida de esquerda, apesar de ter sido declarado como tal. Tanto que logo após se eleger começou a se distanciar do partido Peru Livre, afirmando que não era comunista e sim um socialista conservador, seja lá o que isso seja. Observando a realidade e o peso da direita peruana, ele acreditou que poderia governar cedendo alguns anéis, mas a história está aí para provar que não há qualquer possibilidade de uma política de conciliação com a classe dominante dar certo. Castillo conseguiu entre trancos e barrancos terminar o primeiro ano de mandato, mas a batalha contra ele segue sem trégua. Resta saber se o presidente do Peru conseguirá o apoio popular para seguir governando. Fez uma fala dura no discurso feito ontem à nação, mas vai precisar mais do que isso para cativar os peruanos que não conseguem vislumbrar mudanças significativas sob a batuta do professor. O drama dos peruanos e de toda América Latina Peru: mais um ataque da direita contra o governo Peru: difícil começo    

Tio Sam, ajuda aí…

Tio Sam – Precisamos falar das nossas derrotas. Estamos no chão. A esquerda brasileira se desmancha no ar, ainda que nunca tenha sido tão sólida. Ao que parece venceu a enganadora ideia de que é possível domesticar e amansar o capitalismo. Cenas como a de uma comissão de brasileiros notáveis indo pedir “ajuda” a Joe Biden para que ele defenda a democracia brasileira beira o patético. A viagem, organizada por um tal de Washington Brazil Office (WBO), levou representantes de várias ONGs e movimentos sociais brasileiros a uma reunião com o Departamento de Estado estadunidense e congressistas. O pedido feito foi para que o EUA reconheçam o resultado das eleições brasileiras. Esse tipo de coisa realmente nos coloca nocauteados. Que passa pela cabeça de alguém que acredita poder encontrar nos EUA um aliado para a liberdade, autonomia e soberania? É como se uma zebra acreditasse ser possível sentar à mesa com o leão, tendo apenas pedido inocentemente que não a coma. Ora, é da natureza do leão comer a zebra. Essa triste cena que tem capturado movimentos e organizações importantes no país revela a fraqueza dos mesmos e a incapacidade de encontrar na própria gente brasileira os aliados. Quem então deveria defender essa pretensa democracia? Os Estados Unidos? Esse mesmo país que com o discurso de “defender a democracia” tem invadido países e destruído povos inteiros. Afeganistão, Iraque, Haiti, Síria, isso não mostra a verdadeira natureza desse país “democrata”? Essas pessoas que representam movimentos e organizações realmente acreditam que Bernie Sanders agiria diferente na relação com a América Latina ou o mundo árabe? Ora, Bernie Sanders se destacou dentro do Partido Democrata por aderir às pautas particularistas que tanto têm encantado os movimentos sociais. Temas sobre o racismo, a mulher, LGBTQI+, gênero são colocados no topo da lista das demandas. Não há um questionamento radical ao capitalismo. O que está em jogo é amansá-lo cedendo algum anel aqui ou ali dentro destas particularidades. Essa proposta de fragmentar a luta dos trabalhadores nasceu lá mesmo, nos Estados Unidos, não por acaso. O centro do poder sabe quando a luta está avançando e trata de encontrar formas para arrefecê-la. O teórico equatoriano Agustin Cueva já apontava, nos anos 1980, sobre como os Estados Unidos começavam o desmantelamento da esquerda latino-americana com o financiamento dos institutos sociais democratas e organizações não-governamentais. Foi um plano. O conceito de luta de classe foi aplastado pela oposição Estado/Sociedade Civil. As demandas sociais passaram a ser bandeiras dos movimentos e não das instituições políticas, rompendo-se o vínculo que tornava cada luta particular uma parte da luta geral dos trabalhadores. Cueva alertava já que a dita “sociedade civil” dentro do capitalismo é ilusória porque não mexe nas estruturas do sistema. A ideia de tirar o Estado do poder vale apenas para os movimentos, a burguesia continua ali, mandando e decidindo e inclusive financiando a ilusão. Com essa ideia de “empoderar” os movimentos, a luta de classe se desvanece. Lá nos anos 1970/1980 o argumento para o fortalecimento de grupos de lutas particulares foi de que as organizações políticas – partidos – não tratavam das subjetividades e apenas faziam política. Bom, Frantz Fanon já mostrou no seu relato sobre a revolução argelina como a luta política leva ao enfrentamento dos temas particulares e subjetivos e como a sociedade muda – inclusive nos costumes e na cultura – quando vive uma revolução. Mas, Fanon, apesar de lido pela esquerda, parece não ser entendido. Cueva é categórico, no seu livro “As democracias restringidas na América Latina”, ao dizer que o que faz os países do sul do mundo não terem democracia não está ligado à vocação autoritária de seus governantes, mas sim ao fato de serem países dependentes. Isso significa que seja democrata o quanto for um país da América Latina não terá uma democracia participativa real enquanto for dependente. E se são dependentes por conta do império, como vamos buscar ajuda no império para fortalecermos nossa democracia? Nosso alerta a todos esses movimentos agora organizados no  Washington Brazil Office (WBO) é para que leiam Álvaro Vieira Pinto. Ele também acerta na mosca ao dizer que a nossa primeira tarefa é entender porque vivemos num “vale de lágrimas”. Esse vale de lágrimas é criação do capitalismo e só vai acabar com a destruição desta estrutura. Os problemas que vivemos não são individuais ou particulares, eles dizem respeito às relações sociais que se estabelecem nesse modo de vida. Álvaro Vieira Pinto também já falava na ilusão das lutas de grupos específicos que só mascaram a sociedade de classe. Os pequenos avanços de grupos dão a impressão de que há mobilidade no sistema, que pode haver mudança, mas é ilusão. O centro do capital não permitirá jamais que isso avance para uma mudança no sistema, a sociedade de classe seguirá intocada ainda que haja “mais” direitos para mulheres, negros, indígenas e LGBTQI+. Essas são lutas importantes que precisam estar vinculadas visceralmente à destruição do sistema. Mas, essa parece ser uma batalha perdida, pelo menos nesse momento. Qualquer discussão sobre o tema garante logo uma enxurrada de pedras em quem ousa criticar os movimentos. Lembro que quando começaram os Fóruns Sociais Mundiais lá pelo início dos anos 2000 esse era o tema central: capitalismo humanitário ou socialismo? Naqueles dias já se vislumbrava o risco que seria cair no canto da sereia. Afinal, a proposta de humanização do capitalismo trazia recursos gordos para as instituições que aceitassem essa lógica. Foi uma armadilha bem urdida e vem mostrando agora os resultados. Ver os mais importantes movimentos de luta brasileiros indo aos Estados Unidos pedir reconhecimento para as eleições brasileiras poderia ser o fim da picada, mas temo que seja apenas o começo de uma picada trágica rumo ao desastre. A guerra fria esquenta China e as eleições brasileiras – Conversa ao vivo com Elias Jabbour Como Augusto Sandino enfrentou os Estados Unidos

Quatro anos de Bolsonaro: desastre para os trabalhadores, alegria para os empresários

Governo Bolsonaro – Durante um bom tempo muita gente trabalhou com a ideia de que a criatura que hoje está na presidência do país era um bronco, incapaz de governar. Nada mais errado. Nesses quatro anos, ele colocou para andar todas as suas promessas, garantindo praticamente todas as pautas da elite dominante. Já nos primeiros dias de governo declarou guerra aos povos indígenas, disposto a entregar as terras protegidas para o latifúndio e a mineração. Não fosse a histórica capacidade de resistência e luta dos indígenas, isso já teria sido levado a cabo. Ainda assim, o preço tem sido alto para as comunidades que seguem vendo seus filhos assassinados, violentados ou desaparecidos. Além das vistas grossas diante das invasões de terras e jagunçagem contra os povos originários, o governo atuou lentamente no processo de queimadas criminosas envolvendo a Amazônia e o Pantanal. Perdem os indígenas, os ribeirinhos, os pequenos agricultores e ganha o agronegócio, que avança sobre a terra alheia sem que ninguém ponha freio. No que diz respeito à saúde, o desmonte tem sido dramático. O combate à pandemia, por exemplo, só foi dado por conta dos trabalhadores, que se desdobraram para atender a população, muitas vezes até sem os equipamentos de segurança. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, 13 mil e 600 deles morreram, um dos maiores números em todo o mundo. Ainda assim, jamais receberam qualquer incentivo ou agradecimento. Os hospitais seguem tendo baixos orçamentos e não conseguem dar conta da proteção da população. Na rede básica de saúde também é igual. Diminuem as verbas e estrangulam os atendimentos. Perde a maioria da população e ganham os empresários da doença, que acabam criando uma série de alternativas de “medicina barata” para os desesperados. Telemedicina e planos de saúde de baixo valor, mas de baixa cobertura, proliferam no país que se aproxima de 700 mil mortos pela Covid-19. Na educação, muitas foram as bombas de destruição. As mudanças no ensino médio empobreceram ainda mais a já frágil qualidade que os estudantes tinham e acabaram incentivando a desistência dos alunos. No ensino fundamental,mais de 650 mil crianças deixaram a escola. A escola pública agoniza sem verbas. No que diz respeito ao ensino superior, o desastre também é grande. Com o sistemático corte de verbas, as universidades não conseguem dar conta das políticas de permanência e muitas sequer conseguem pagar as contas básicas. A pesquisa, a ciência, o estudo, tudo isso é visto com desdém e ano após ano as verbas foram escasseando. Perde a juventude, perde a ciência, perde o país. Mas, não se enganem, isso parece muito bom para as empresas estrangeiras que vendem tecnologias e abre as portas para a ampliação da rede privada de ensino superior, que, excetuando uma ou outra universidade de existência história, só consegue oferecer ensino de segunda classe. Na economia vivemos um drama sem igual se considerarmos as últimas décadas. Gasolina a sete reais, alimentos a preços altíssimos. O leite, por exemplo, passa dos sete (7!) reais o litro. A fome, que já tinha sido erradicada, voltou com força e chegamos de novo a 33 milhões de famintos. Enquanto isso, o comércio, que não aceita perder lucros, passou a vender pele de galinha, ossos, e até as caixas de papelão usadas. Uma situação que praticamente duas gerações não chegaram a conhecer. Apesar de tudo isso a população ordeiramente espera as eleição, ainda que o presidente venha se movendo no sentido de não aceitar qualquer resultado que não seja a sua vitória. Ele traçou uma estratégia de denunciar que o Supremo Tribunal Federal está com Lula, que o Tribunal Superior Eleitoral está com Lula e que todos juntos vão fraudar as eleições para o petista vencer. Insiste em espalhar mentiras sobre o sistema eleitoral e já colocou em campo os seus aliados generais. Ele já apontou que não vai parar e tem um objetivo bem claro: seguir governando. Como o Congresso Nacional foi aliado nesses quatro anos de destruição, não há de ser ali que ele encontrará resistência. Não bastasse isso sua base eleitoral se mantém entre 25 e 30% da população, com tendência a aumentar depois da jogada de mestre em garantir auxílio para os empobrecidos, caminhoneiros e até taxistas até dezembro deste ano. O cenário para os próximos meses é sombrio, com a tendência de muito aumento da violência por motivos políticos, visto que o presidente incentiva seus apoiadores a fazerem o que for preciso para barrar o PT, que ele chama de comunismo. Nada mais longe disso, mas a população tem sido sistematicamente orientada a pensar assim, seja pelas redes sociais, seja pela mídia comercial que também é aliada do presidente. A campanha não será uma campanha qualquer. Mas, por outro lado, não se observa nem os sindicatos, nem as centrais, nem os partidos progressistas (?), atuarem no sentido de enfrentar essa avalanche de mentiras e bravatas ao estilo de Donald Trump, em quem Bolsonaro se inspira. Enquanto isso, a classe dominante esfrega as mãos. Está tudo bem pra ela. Um dia na Ocupação Manoel Aleixo, em Mauá https://urutaurpg.com.br/siteluis/retrocesso-efeitos-de-quatro-anos-de-governo-bolsonaro-no-brasil/ No capitalismo, o governo é dos ricos A dura realidade brasileira  

China e as eleições brasileiras – Conversa ao vivo com Elias Jabbour

Colaborou Letícia Coimbra O CONVERSA AO VIVO ZONACURVA recebeu no dia 30 de junho Elias Jabbour, doutor e mestre em Geografia Humana pela FFLCH-USP, além de escritor e professor dos Programas de Pós-Graduação em Relações Internacionais (PPGRI) e em Ciências Econômicas na UERJ (PPGCE). O programa foi apresentado por Fernando do Valle, editor do Zona Curva. Há 25 anos, Elias se dedica às temáticas do socialismo e da experiência chinesa. É autor de inúmeros livros a respeito, sendo “China: o socialismo do século XXI”, lançado no ano passado pela Editora Boitempo, o mais recente. Segundo ele, seus estudos sobre esses temas começaram enquanto fazia uma iniciação científica durante a graduação em 1996. Elias afirmou na entrevista que as mais variadas de forma de socialismo é o que o move enquanto pesquisador. Propriedades públicas e privadas De acordo com o professor, a propriedade pública predomina na China atual e o setor público é a locomotiva da economia que segue as diretrizes do partido comunista. Jabbour acredita que o socialismo vigente na China ainda é embrionário, ou seja, está em seu estado inicial e está sendo formatado gradualmente. “A China não é um país capitalista do ponto de vista jurídico. De acordo com a Constituição, a propriedade pública dos meios de produção é o lucro da economia chinesa, e as outras formas de propriedade são auxiliares”. O professor ressalta que, diferente do ocidente, na Ásia, a propriedade privada é concessão do Estado, podendo ser contestada pelo mesmo. Por outro lado, ele afirmou que há áreas econômicas no país controladas pelo setor privado. “Essa questão do setor privado é muito mal explicada e muito enviesada, porque nós somos muito apegados à forma privada […] No fundo, o direito do capitalismo é o direito de regular e legitimar a propriedade privada. O código civil é um elemento que institucionaliza e praticamente sacraliza a propriedade privada”. Como funciona o Partido Comunista da China Jabbour explica que para entrar no Partido Comunista é necessária a aprovação, e mesmo o líder chinês Xi Jinping conseguiu apenas na nona tentativa. E mesmo após a admissão, existe um longo processo obrigatório até “chegar no topo da pirâmide”. Segundo ele, a base que elege um deputado é a mesma que cassa seu mandato, causando maior rotatividade e impossibilitando, por exemplo, de alguém como Bolsonaro permanecer no mesmo cargo por quase três décadas como deputado.  “Eu acho que esse sistema chinês é uma democracia não-liberal, cujas possibilidades – ‘possibilidades’, não estou falando que é real – são muito maiores do que aqui no ocidente. […] Apesar de ser um partido único, as políticas da China mudam o tempo inteiro”. Relação do Brasil com China e Estados Unidos Em resposta à pergunta de Fernando se Lula seria pró-China em repercussão à reunião de Jair Bolsonaro (PL) com o presidente dos Estados Unidos Joe Biden na Cúpula das Américas, em que o presidente atual tentou o apoio norte-americano para sua reeleição com base nessa afirmação, Elias explica que o petista é um “estadista” e, portanto, tem a visão de que “o Brasil é muito grande para caber no quintal de alguém, nem da China nem dos Estados Unidos”. “O Brasil tem uma tendência histórica de se apropriar desses conflitos de hegemonia no mundo para se dar bem no final”, afirma. “O que eu vejo não é que o Lula seja pró-China, é que a China tem muito mais a oferecer para o Brasil do que os Estados Unidos”, diz o professor. Ele ressalta que é natural que a China tenha relações com o Brasil porque ambos têm interesses em comum, mas destaca que também é importante manter uma boa relação com o país norte-americano. “O Brasil sofre intervenções estrangeiras desde 2013 […] e o Lula sabe disso, tanto é que a palavra que ele mais fala em seu discurso é ‘soberania’, hoje ele é o cara da soberania nacional”. O professor explica que a relação com a China traz benefícios a longo prazo, mas as elites brasileiras se apegam muito em interesses imediatos’. “A China garante para o Brasil grandes superávits comerciais, que resolvem nosso problema a curto prazo, mas acaba com o nosso longo prazo, porque o Brasil vai se precarizando”. O professor ressalta a importância de manter acordo estratégico onde o Brasil receba, em troca, grandes investimentos em infraestrutura. Falando ainda sobre Lula, ele afirma que o petista “tomou para si a bandeira do Brasil”, se tornando um líder nacionalista, que prioriza os interesses do país independentemente dos conflitos externos.  Recentemente, Irã e Argentina fizeram um pedido de adesão aos BRICS, um bloco de países emergentes no qual fazem parte Brasil, Rússia, Índia, China e Africa do Sul. Pensando que quase metade da população mundial está inclusa nesse grupo e que países como Rússia e China são atualmente grandes influenciadores globais, o professor explica que a tendência é que mais nações façam parte dele e que sua relevância seja ainda maior que a do G7, grupo que reúne os sete países com as maiores economias do mundo. A terceira morte de Trotsky Tio Sam, ajuda aí… Soci@lismo 2.0 e a história do voto no Brasil Dos horrores do capitalismo Capitalismo é religião?

A grande mídia irá apoiar Bolsonaro nas eleições de 2022?

  Colaborou Letícia Coimbra No dia 20 de junho foi realizada a LIVE POLÍTICA DE SEGUNDA, cujo tema principal foi o possível apoio da grande mídia ao  Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022. O programa foi apresentado por Fernando do Valle, editor do Zona Curva, e contou com a participação do advogado Roberto Lamari e de Luis Lopes, editor do Portal Vi Shows. Fernando abriu a live afirmando que, apesar da grande imprensa ter perdido parte de seu poder, ainda influencia muito o debate nas redes sociais. Segundo ele, algumas emissoras de televisão como o SBT e a Record são aliadas do atual presidente, mas os grandes jornais criticam sua política e concordam com o ultraliberalismo de Paulo Guedes, o que gera um posicionamento esquizofrênico por parte dos barões da mídia.  O jornalista ressalta, porém, que caso houvesse um esforço maior e a grande mídia investigasse os escândalos do atual governo, a imprensa teria conseguido a aprovação de um processo de impeachment tal como houve com a ex-presidente Dilma Rousseff. Lamari concorda com a fala de Fernando a respeito da influência da mídia hegemônica, e ressalta que 70% dos assuntos reproduzidos nas redes sociais têm origem na mídia tradicional. Além disso, afirma  que não vê apoio a Bolsonaro, mas críticas, mesmo em jornais conservadores. De acordo com ele, parte da falta de apoio se dá pelas críticas do presidente à grande mídia e acredita que a possibilidade maior é de neutralidade no pleito deste ano. “Não acredito que a imprensa embarque na campanha do Bolsonaro”, afirmou o advogado. Já Luis discorda, relembrando as eleições de 2018, quando mesmo diante das ameaças e notícias falsas ditas pelo atual presidente, a imprensa não reagiu e ressalta seu receio da mídia deixar as fake news e “barbaridades” passarem ilesas para manipular a eleição. Pensando em 2022, ele destaca que os principais veículos de imprensa concordam com a política econômica do atual governo em relação à Petrobras e, devido a isso também, falta pluralidade de ideias.  “Bolsonaro está numa campanha explícita de vender a Petrobras e está cooptando as elites financeiras e econômicas da qual a mídia é um puro porta-voz porque essas empresas não ganham mais dinheiro com empresa de mídia. Elas ganham dinheiro com outras empresas que elas têm no grupo”, disse o editor do Portal Vi Shows. Em relação a isso, o editor ZonaCurva ressalta a importância de diferenciar os jornalistas (funcionários) dos donos dos meios de comunicação porque os últimos têm “espírito de classe” e às vezes possuem segundas intenções por trás da notícia. Segundo Fernando, caso a candidatura de Simone Tebet (MDB), candidata da terceira via que tenta estabelecer maiores chances de competir com o ex-presidente Lula (PT) e Bolsonaro nas eleições deste ano, não dê frutos, a grande mídia irá focar em ferir a imagem do petista, o atual candidato do Partido dos Trabalhadores à presidência da República. O editor ainda menciona o relatório anual do Reuters Institute for the Study of Journalism, da Universidade de Oxford, que revela que 54% dos entrevistados brasileiros dizem evitar o noticiário de propósito. Segundo ele, esse é um fator que torna essas pessoas vulneráveis à propagação de desinformação. Já Luis Lopes acredita que o alto índice é, na verdade, uma consequência das fake news. Meus votos a presidente Golpe como cortina de fumaça A terceira via morreu?

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