A América Latina e os Estados Unidos
Estou fazendo o curso da Camila Vidal, no Iela (Instituto de Estudo Latino-Americanos da UFSC) sobre as Intervenções dos Estados Unidos na América Latina. E, confesso, ao final de cada aula, saio completamente deprimida. Não pela aula, que é sempre ótima, mas pelas informações. A proposta do curso, que começou no ano passado, é desvelar, com riqueza de detalhes, cada intervenção dos Estados Unidos nos países da Pátria Grande, desde o roubo das terras mexicanas, primeiro conflito gerado pelo famoso Destino Manifesto, até nossos dias. O que causa a profunda tristeza é observar que nesses conflitos de invasão explícita ou de geração de golpes a conversinha é sempre a mesma: levar a democracia e o desenvolvimento aos países bárbaros. É um eterno retorno. Basta que o país se desloque, mesmo que bem pouquinho, da órbita dos Estados Unidos para que comece a sofrer as consequências. As formas de ataque também são sempre as mesmas, embargos, bloqueios econômicos, campanha midiática sobre um suposto perigo de comunismo, financiamento de grupos de “oposição” (armados ou não) e invasão direta. No geral, a situação que gera o ataque dos EUA também é sempre a mesma. Um governo mais à esquerda ou um governo algo progressista que comece a mudar a lógica garantindo educação, saúde, moradia e seguranças ao povo passa a ser visto como perigoso. E, se não se aliar aos EUA nos seus interesses, já vira inimigo. Mas, se for além, buscando garantir soberania nas ações e na exploração de suas riquezas, aí vira o próprio demônio. É hora de o império agir. O começo de tudo vem pela campanha de propaganda contra o país. A mídia mundial embarca na canoa, divulgando as notícias produzidas pelas agências dos EUA, como se ali estivesse a verdade. Principia então o desenho do “monstro”. E não importa que esse monstro tenha sido amigo e formado pelos Estados Unidos, como foi o caso de Noriega, no Panamá, ou Sadam, no Iraque. Saiu um pouco da rota, está na fogueira. No geral, o problema principal detectado é uma “tendência ao comunismo”. Começou a oferecer educação, serviços públicos de qualidade, usar os recursos nacionais para desenvolver o país, pronto, virou comunista. E o comunismo aí colocado como algo ruim. Sendo que não é! Na verdade, o comunismo é quase uma sociedade perfeita, onde cada um ganha conforme o que necessita e atua na sociedade para o bem de todos. Pois isso é um perigo para os que dominam, então há que demonizar. E assim vamos indo, estudando a história de cada um dos nossos países da América Latina: O México, na parte norte, a América Central com todo o drama da violência, genocídios e da migração presente em cada país, o Caribe e sua pobreza endêmica apesar da exuberante riqueza natural que o faz paraíso dos ricos, e a nossa América do Sul, com sua história de traições, golpes militares, golpes parlamentares e golpes midiáticos. Não escapa um. Cada país abaixo do rio Bravo já sofreu a intervenção do império, seja diretamente ou fomentando traições internas. É batata. Nenhum bem pode vir para a maioria da população. Há que manter a massa no arrocho e garantir a maior taxa de lucro para o 1% que domina. Saiu disso, tá morto. Nesse universo infernal produzido pelos Estados Unidos o único país que se mantém firme é Cuba, a pequena ilha caribenha que enfrenta há mais de 60 anos o ataque ininterrupto do império. É absolutamente fantástico que consigam manter a revolução e as conquistas que vieram depois dela, apesar de tanto ataque. O povo cubano é deveras extraordinário, afinal é submetido a um bombardeio midiático diário e sofre um embargo econômico criminoso. Apesar disso o povo da ilha se reinventa e resiste, valentemente. Mas, no que diz respeito aos demais países o eterno retorno é lei. Passam anos de ditadura, de governos autoritários ou neoliberais e quando a população finalmente se propõe a mudar e elege alguém menos alinhado aos interesses estadunidenses, lá vem a máquina imperialista, a Estrela da Morte, com todo o seu arsenal ideológico e militar. Só na história contemporânea podemos citar a Venezuela e o golpe armado em 2002 contra Chávez, a deposição de Bertrand Aristide no Haiti em 2004, criando esse caos que não tem fim no país, o golpe em Honduras em 2009 que deixou um rastro de sangue, a queda do presidente Lugo no Paraguai para o retorno da velha oligarquia, a queda da Dilma em 2016 no Brasil que levou à tragédia Bolsonaro, o golpe contra Evo Morales em 2019, a queda de Pedro Castillo em 2022, as tramas na América Central para impedir que ideias mais arejadas pudessem assomar, com o sistemático assassinato de lideranças de lutas populares e ambientais, e por aí vai. É claro que numa análise mais acurada a gente vai perceber que internamente nos países há erros e equívocos praticados pelos governantes, o que torna a ação imperial ainda mais fácil de ser efetivada. Mas, o que não se pode deixar de perceber é que os EUA estão sempre ali, como uma águia assassina a esperar a hora de comer os olhos dos governantes – e da população – que ousarem sair da linha. Volto a lembrar de Cuba, cujo presidente, Fidel, chegou a sofrer mais de 600 tentativas de assassinato. Sobreviveu a todas e para azar do império, morreu velhinho, no aconchego do lar, do jeito que quis, amado pelo povo. De novo, um exemplo solitário nesse mar de podridão criado pelos Estados Unidos em toda a nossa Pátria Grande. O fato é que no capitalismo, cuja locomotiva ainda é os EUA (China e Rússia disputam o cargo), resistir a esse modelo que garante riqueza e vida boa a apenas 1% da população é uma tarefa gigantesca. As populações lutam com o que podem, que são apenas os seus corpos nus. Como enfrentar a máquina gigantesca da guerra? Lembro-me da invasão ao Panamá em 1989, quando uma força de milhares de soldados estadunidenses bombardeou a