Zona Curva

golpe de 64

A democracia em risco

Democracia – Não nos iludamos de novo: nossa frágil democracia continua em risco. Recordo do governo João Goulart e suas propostas de reformas de base, ao início da década de 1960. As Ligas Camponeses levantavam os nordestinos. Os sindicatos defendiam com ardor os direitos adquiridos no período Vargas. A UNE era temida por seu poder de mobilização da juventude. Era óbvia a inquietação da elite brasileira. Passou a conspirar articulada no IBAD, no IPES e outras organizações, até eclodir nas Marchas da Família com Deus pela Liberdade. Contudo, o Partido Comunista Brasileiro tranquilizava os que sentiam cheiro de quartelada – acreditava-se que Jango se apoiava num esquema militar nacionalista. E, no entanto, em março de 1964 veio o golpe militar. Jango foi derrubado, a Constituição, rasgada; as instituições democráticas, silenciadas; e Castelo Branco empossado sem que os golpistas disparassem um único tiro. Onde andavam “as massas” comprometidas com a defesa da democracia? Conheço bem o estamento militar. Sou de família castrense pelo lado paterno. Bisavô almirante, avô coronel, dois tios generais e pai juiz do tribunal militar (felizmente se aposentou à raiz do golpe). Essa gente vive em um mundo à parte. Sai de casa, mas não da caserna. Frequenta os mesmos clubes (militares), os mesmos restaurantes, as mesmas igrejas. Muitos se julgam superiores aos civis, embora nada produzam. Têm por paradigma as Forças Armadas nos EUA e, por ideologia, um ferrenho anticomunismo. Por isso, não respeitam o limite da Constituição, que lhes atribui a responsabilidade de defender a pátria de inimigos externos. Preocupam-se mais com os “inimigos internos”, os comunistas. Embora a União Soviética tenha se desintegrado; o Muro de Berlim, desabado; a China, capitalizada; tudo que soa como pensamento crítico é suspeito de comunismo. Isso porque nas fileiras militares reina a mais despótica disciplina, não se admite senso crítico, e a autoridade encarna a verdade. O Brasil cometeu o erro de não apurar os crimes da ditadura militar e punir com rigor os culpados de torturas, sequestros, desaparecimentos, assassinatos e atentados terroristas, ao contrário do que fizeram nossos vizinhos Uruguai, Argentina e Chile. Assistam ao filme “Argentina,1985”, estrelado por Ricardo Darín e dirigido por Santiago Mitre. Ali está o que deveríamos ter feito. O resultado dessa grave omissão, carimbada de “anistia recíproca”, é essa impunidade e imunidade que desaguou no deletério governo Bolsonaro. Não concordo com a opinião de que só nos últimos anos a direita brasileira “saiu do armário”. Sem regredir ao período colonial, com mais de três séculos de escravatura e a dizimação de indígenas e da população paraguaia numa guerra injusta, há que recordar a ditadura de Vargas, o Estado Novo, o Integralismo, a TFP e o golpe de 1964. O altissonante silêncio dos militares perante os atos terroristas perpetrados por golpistas a 8 de janeiro deve nos fazer refletir. Cumplicidade não se consuma apenas pela ação; também por omissão. Mas não faltaram ações, como os acampamentos acobertados pelos comandos militares em torno dos quartéis e a atitude do coronel da guarda presidencial que abriu as portas do Planalto aos vândalos e ainda recriminou os policiais militares que pretendiam contê-los. “O preço da liberdade é a eterna vigilância”, reza o aforismo que escuto desde a infância. Nós, defensores da democracia, não podemos baixar a guarda. O bolsonarismo disseminou uma cultura necrófila inflada de ódio que não dará trégua à democracia e ao governo Lula. Nossa reação não deve ser responder com as mesmas moedas ou resguardar-nos no medo. Cabe-nos a tarefa de fortalecer a democracia, em especial os movimentos populares e sindicais, as pautas identitárias, a defesa da Constituição e das instituições, impedindo que as viúvas da ditadura tentem ressuscitá-la. O passado ainda não passou. A memória jamais haverá de sepultá-lo. Só quem pode fazê-lo é a Justiça. Ditadura Nunca Mais com Urariano Mota Breve crítica da democracia louvada Sobre a democracia e o voto Não há meia democracia Frei Betto: “É uma ilusão e um engano achar que a ditadura foi melhor”

Ministério Público de São Paulo denuncia legista Harry Shibata por ocultar assassinato da ditadura

por Fernando do Valle O Ministério Público Federal em São Paulo ofereceu na última semana nova denúncia contra o legista aposentado Harry Shibata, acusado de forjar laudo necroscópico de Helber José Gomes Goulart, da ALN, morto pelo Doi-Codi em julho de 1973. Segundo a acusação, o médico deliberadamente ignorou visíveis lesões de tortura no pescoço e na cabeça do corpo do militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), assassinado por agentes do Doi-Codi comandados por Carlos Alberto Brilhante Ustra. Em abril deste ano, o MPF de São Paulo havia denunciado Shibata por forjar outro laudo, desta vez a respeito da morte do militante político Yoshitane Fujimori em 1970. Passados quase 43 anos da ação militar que resultou na morte de Goulart, até hoje pairam dúvidas sobre o episódio. Segundo a versão do Doi-Codi, agentes daquele destacamento rondavam as imediações do Museu do Ipiranga quando encontraram a vítima em atitude suspeita. Goulart teria sacado o revólver e atirou contra os agentes, que revidaram, atingindo-o, resultando em sua morte. Romeu Tuma, chefe do Departamento do Departamento de Ordem Política e Social, anotou em requisição de exame necroscópico, ao IML que Helber foi morto às 16h de 16 de julho de 1973, mas a entrada de seu corpo no necrotério ocorreu 8h antes. Além disso, depoimentos de ex-presos políticos apontam que o militante da ALN havia sido preso antes e foi visto no Doi-Codi com a cabeça enfaixada, tendo, portanto, sido internado no Hospital Geral do Exército de São Paulo, no Cambuci. Além disso, estudos sobre o laudo necroscópico realizados a pedido da Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) e pelo Ministério Público Federal, no curso do procedimento que resultou na denúncia, concluíram que Goulart foi alvejado com tiros feitos de cima para baixo em sua direção, como se ele estivesse deitado ou ajoelhado. O militante também recebeu tiros no antebraço, sinal de que tentou, em vão, se defender. O laudo solicitado pelo MPF foi produzido pelo mesmo Instituto Médico Legal de São Paulo onde Shibata trabalhou por muitos anos, como um dos legistas de confiança da repressão. Ambos os laudos apontam equimoses na cabeça e no pescoço de Goulart, visíveis em fotos do cadáver, que foram ignoradas no laudo necroscópico subscrito por Shibata e Orlando José de Bastos Brandão (já falecido). O mineiro Helber José Gomes Goulart nasceu na cidade de Mariana em 19 de setembro de 1944 e era filho de um militante comunista. Ele começou a trabalhar aos 11 anos de idade e estudou até o segundo colegial, quando mudou-se para São Paulo em busca de melhores oportunidades. Ele começou a militância política cedo, junto com o pai, no PCB. Em 1964, por conta do golpe militar, passou a ser perseguido e respondeu a processo na Auditoria Militar de Juiz de Fora. Depois de militar na Corrente, chegou à ALN e, em 1971, quando a organização começava a se desmantelar, Goulart, já clandestino, é deslocado para São Paulo, onde foi assassinado. Enterrado no Cemitério de Perus, seu corpo só foi identificado 19 anos depois, após a descoberta da vala clandestina. A procuradora da República Ana Letícia Absy, autora da denúncia, pede a condenação de Shibata pelo crime de falsificação de documento público, cuja pena é de 1 a 5 anos, com o agravante de que o crime foi praticado para ocultar crime praticado por outra pessoa e garantir a impunidade. Leia a íntegra da denúncia do Ministério Público. Com informações da Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República no Estado de São Paulo. https://urutaurpg.com.br/siteluis/em-1970-os-tupamaros-de-mujica-contra-dan-mitrione-o-mestre-da-tortura/ Rubem Fonseca e o silêncio que não apaga o passado

Meu fio de esperança

por Frei Betto Sou vivido. Vi o Brasil passar por muitas crises. O suicídio de Vargas, em agosto de 1954, estragou meu aniversário de 10 anos. JK soube, em 1956, contornar a rebelião militar de Jacareacanga. A renúncia de Jânio, em 1961, me levou às ruas pela primeira vez, em defesa da democracia. O golpe militar de 1964 me arrancou da faculdade de Jornalismo para atirar-me nas masmorras do CENIMAR (Centro de Informações da Marinha). O AI-5 me desempregou do jornal e, meses depois, me conduziu a quatro anos de prisão. Autocrítica da esquerda   Meu sonho, ainda hoje, é o socialismo. Fora da Igreja há salvação. Mas não há salvação para a humanidade fora de um sistema no qual haja partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano, e onde os direitos humanos estejam acima dos privilégios do capital. Para um sonho se tornar realidade são necessárias mediações. Busquei-as na Ação Católica. Os bispos, pressionados pela ditadura, a desmantelaram. Apoiei organizações revolucionárias contra a ditadura. A repressão as derrotou. Tornei-me eleitor do PT. O partido se deixou contaminar pelo elitismo e a corrupção, em treze anos de governo não promoveu nenhuma reforma estrutural, e calou-se quanto ao socialismo. Hoje, voto PSOL. Meu fio de esperança se prende aos movimentos sociais. Não são perfeitos. Neles há também oportunistas e corruptos. Mas estes são exceções. Porque a base da maioria dos movimentos é a gente pobre que luta com dificuldade para sobreviver. Essa gente costuma ser visceralmente ética. Não acumula, partilha. Não se entrega, resiste. Não se deixa derrotar, levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima. Não sei o que será do nosso Brasil nos anos vindouros. Sei apenas que fora dos movimentos sociais a nação não tem salvação. O PT tentou e se deu mal. Em uma sociedade tão marcadamente dividida em classes sociais, somente o vínculo orgânico com os pobres nos mantém com os pés no chão, a alma repleta de fome de justiça e a cabeça fiel à utopia socialista. A democracia é uma senhora muito ciosa de suas origens. Todas as vezes que tentam prostituí-la, sequestrá-la, corrompê-la, reage e desmascara seus algozes. Ela prefere sempre se abrigar em seu ninho: o protagonismo popular. O capitalismo tenta nos ludibriar, convencer-nos de que democracia é sinônimo de rotatividade eleitoral. Ora, a verdadeira democracia se apoia na economia, na partilha das riquezas; na ecologia, ao cuidar da proteção ambiental; na cultura, ao assegurar a todos o direito de criar e se expressar; e na política, ao dotar todos os cidadãos e cidadãs de poder para monitorar os rumos do Estado e, portanto, da sociedade. Nenhuma esquerda ideológica se sustenta por muito tempo sem este respaldo fisiológico: o contato direto com os movimentos nos quais os pobres se organizam e lutam por seus direitos.  Publicado originalmente no Blog da Cidadania.

Os golpes

por Carlos Fico Se consumado, o impeachment de Dilma Rousseff será um duro golpe na democracia brasileira, inclusive em função da banalização desse instrumento, que, nesse caso, terá sido usado duas vezes no Brasil em pouco menos de 25 anos. “Que país é esse” – para citar frase de tristíssima memória – no qual temos de recorrer ao impeachment com essa frequência? A longa tradição de golpes ‘brancos’ no Brasil Será, também, um tremendo golpe político baseado em injustiça gritante, afinal, até o presente momento, a presidente Dilma Rousseff não foi acusada de envolvimento na Operação Lava Jato e o crime de responsabilidade que se menciona (“pedalada fiscal”) é cometido por virtualmente todos os governantes brasileiros há muito tempo. É essa percepção de injustiça flagrante que leva muitas pessoas a chamar a tentativa de impeachment de “golpe”, seguramente querendo dizer “golpe de Estado”. Não é o caso, mas algumas circunstâncias são de fato agravantes da mencionada injustiça. Por exemplo, diversos parlamentares condutores do processo são suspeitos de crimes diversos, o início do processo foi corrompido por espírito de vingança, a própria motivação do pedido de impeachment não repousava em convicções fortes (o documento inicial é débil). Outros exemplos poderiam ser citados. A palavra de ordem “não vai ter golpe” deu oportunidade aos defensores doimpeachment para que afirmassem o óbvio: ele está inscrito na Constituição. Isso desviou a discussão para o terreno jurídico, que não frutificará. Aliás, ao contrário do que muitos dizem, a caracterização das “pedaladas fiscais” como crime de responsabilidade não é impossível, de modo que a discussão legal no contexto de um processo político é vã. Tudo se resume ao número de votos de que dispõe o governo e à capacidade que tem de postergar a decisão final. Se o Congresso aprovar o impeachment, dificilmente o STF desfará a decisão pois, nesse caso, teríamos crise institucional sem precedentes. A palavra de ordem “não vai ter golpe” também provoca uma contradição, uma desnecessária dificuldade de natureza racional: se o processo deimpeachment é entendido como golpe, a atuação parlamentar que busque impedi-lo não o estaria legitimando? Lembre-se, finalmente – sem querer fazer paralelismos indevidos – de que, pouco antes de 31 de março de 1964, setores da esquerda garantiam que não haveria golpe: “se a direita levantar a cabeça…” Se não estamos vivendo plenamente um golpe de Estado no momento, certamente estamos vendo sinais expressivos de adesão a soluções fáceis e autoritárias, sobretudo essa, do impeachment, para resolver a insatisfação com o governo (que, no presidencialismo, se resolve com a próxima eleição). Muitos outros indícios de autoritarismo têm sido vistos em relação a outros episódios, especialmente no contexto da Operação Lava Jato, como as ações políticas do juiz e dos procuradores e, muito especialmente, na grande imprensa que, por razões óbvias, despreza os detalhes e aposta na catástrofe. Isso sem falar nas manifestações de violência e autoritarismo da própria sociedade. O golpe de Estado de 1964 completa 52 anos hoje. Penso que ele tem grande atualidade. Em 2014, nos 50 anos do golpe, escrevi em livros e repeti em dezenas de palestras que repensar o golpe era importante porque isso nos permitia refletir sobre o persistente autoritarismo brasileiro. Tendo em vista o apoio de setores da sociedade ao golpe de 1964, eu dizia: “a questão que se impõe, para mim, é a seguinte: até que ponto a sociedade brasileira aceitou – ou ainda aceita – fórmulas autoritárias para a resolução de seus conflitos?” Parece-me que a questão continua muito atual e a resposta, infelizmente, óbvia.

Depois do entreguismo subterrâneo do Pré-sal, só resta a terceira via

por João Vicente Goulart*, da Agência Carta Maior O que vimos na votação do PLS 131 da Petrobras foi vergonhoso, rasteiro, inoportuno com nossa história de lutas à mercê da traição governamental da qual tínhamos esperança de resistência. Estamos, todos aqueles que amamos o Brasil e nossa nacionalidade, iludidos, magoados e com muita falta de esperança, roubada no mais indigno e subterrâneo ocaso oportunista da subtração de nossos princípios de luta, com a atitude do governo ao negociar por debaixo do tatame a entrega do Pré-Sal, e a retirada da Petrobras do controle dos investimentos de nossas riquezas petrolíferas. A negociação espúria, ao apagar das luzes, deixou os próprios parlamentares da base a ver navios. Navios negreiros, navios dos anjos negros, navios das sete irmãs petroleiras internacionais que naquele momento zarpavam e começavam a navegar a partir de nossas costas, transportando nossas esperanças como fizeram portugueses e espanhóis na nossa América Latina colônia. O ouro mudou de cor, mas não mudou de dono. Sentimo-nos traídos e pior, desamparados por quem acreditávamos estar confiando e defendendo o patrimônio público de nossa Pátria. A surpresa após a votação no Senado com o placar de 40 a 26, com duas abstenções, negociados dentro do Planalto com a oposição na parte da tarde, retirando da Petrobras a primazia do direito de exploração do Pré-Sal, foi um ato de covardia, pois, não precisava tanto, bastava então, entregar o governo aos grandes bancos, aos interesses multinacionais, ao mercado ou, se quisessem aos perdedores da eleição de 2014, para que capitaneassem essas naves junto aos entreguistas e outros mercadores do destino nacional, terminando de privatizar o Brasil, ou melhor, continuar a vendê-lo como fez  o príncipe guru das privatizações, FHC, lesando a Pátria, seus filhos e descendentes, como um verdadeiro Pizarro, sangrando as “veias abertas” de nosso povo. Está na hora de repensar nosso destino, nossos caminhos, reaver nossas esperanças e mergulharmos na história do trabalhismo; reagrupar as forças, extrair de nossas raízes os exemplos de lutas e de propostas da resistência nacional.  E, para tanto, temos direito de chão adquiridos ao longo de nossa trajetória. Temos história de sobra para isto. O trabalhismo propôs ao país o salário mínimo, a CLT, o voto feminino, a organização sindical, a reforma agrária, a reforma tributária, taxando o patrimônio das empresas, não os assalariados. Propusemos a reforma educacional, a lei do controle das remessas de lucros, a reforma urbana, a reforma bancaria que nenhum outro governo se animou a tocar; já desapropriamos empresas estrangeiras que exploravam e sugavam os trabalhadores brasileiros, já encampamos refinarias e outorgamos o monopólio a Petrobras, tanto da extração quanto do refino e já mostramos do que somos capazes, sem temer as reações dos prepotentes das baionetas e dos donos do capital. Já é hora de lembrar isto ao povo brasileiro: nossas riquezas são nossas e não de quem tenha mais. A democracia é a arte política da maioria de conquistar novos objetivos e não pode ser traída por interesses pessoais imaginando a eventualidade da ruptura institucional, arquitetada por manipulações subterrâneas em tribunais não representativos ou eleitos. Já sofremos golpes contra nossas propostas, já amargamos exílio por não trair as conquistas sociais e políticas do nosso povo. Mas continuamos a almejar a libertação de nossos trabalhadores, donos reais de todas as riquezas desta terra miscigenada e brasileira. A eleição de 2018 está próxima e nós temos história, nela temos propostas e no caminho desafios. Falta botar a coragem na rua, “nas praças que são do povo e só ao povo pertencem”, e como disse também Jango, alertando os falsos democratas:  “Desgraçada a democracia se tiver que ser defendida por tais democratas. Democracia para esses democratas não é o regime da liberdade de reunião para o povo: o que eles querem é uma democracia de povo emudecido, amordaçado nos seus anseios e sufocado nas suas reinvindicações. A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia anti-povo, do anti-sindicato, da anti-reforma, ou seja, aquela que melhor atende aos interesses dos grupos a que eles servem ou representam. A democracia que eles querem é a democracia para liquidar com a Petrobrás; é a democracia dos monopólios privados, nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício.” Nossa proposta deve ser clara, objetiva e transformista, na legalidade constitucional, na doutrina que nos orienta do positivismo, mas além de tudo ampla e nacionalista. Vamos propor a nossa luta sem dissimulo, vamos propor a retomada e reestatização da Vale, da Embratel, Telesp, Telemar, CEEE, CSN, BEG, BEA, etc., etc. e de tantas outras privatarias que não caberiam neste artigo. A terceira via está em curso. É o trabalhismo nacionalista. Tem cara e tem coragem, tem história e realizações suficientes para a retomada da Pátria, para a retomada da soberania, da dignidade, da educação e das oportunidades iguais para todos. Basta de conversinhas meritocratas em um país tremendamente injusto e sem igualdade de oportunidades. Basta de discursar pelos pobres outorgando privilégios para os barões da mídia e para banqueiros. Fazendo concessões espúrias no apagar das luzes. O bipartidarismo entre oposição e governo está no fim, está nas mãos do povo brasileiro em 2018, construir a terceira via. A terceira via é a via trabalhista e nacionalista, vamos abraçar esta luta, vamos abraçar o Brasil. Com liberdade não ofenderemos, não temeremos e muito menos compactuaremos com os direitos de nossos trabalhadores. * João Vicente Goulart é diretor do Instituto Presidente João Goulart e filho do ex-presidente Jango.

A morte de Vladimir Herzog e o Brasil que não queremos

Bem-vindo ao Fatos da Zona, onde adaptamos icônicos textos do site do Zonacurva Mídia Livre. Explore a extraordinária vida de Vladimir Herzog, ícone da luta pela justiça e liberdade no Brasil durante a ditadura militar. Neste vídeo, mergulhamos nos momentos cruciais de sua trajetória e em seu compromisso incansável com a verdade e a democracia.   por Fernando do Valle Vladimir Herzog – Noite de 24 de outubro de 1975, agentes da ditadura chegam à redação da TV Cultura com a ordem de levar o diretor de jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog, para depor sobre suas ligações com o PCB – Partido Comunista Brasileiro no II Exército. Iniciou-se ali uma negociação entre os jornalistas da redação e os agentes para que Herzog se apresentasse no dia seguinte. Os policiais aceitaram o acordo e um jornalista comprometeu-se a acompanhar Herzog no outro dia até as instalações militares, esse jornalista inclusive dormiu na casa do diretor da TV Cultura. Se tivesse descumprido esse acordo e escapado na madrugada, Herzog não teria sido torturado até a morte no dia 25 de outubro de 1975, ele tinha apenas 38 anos. A brutal morte do jornalista indignou parte da sociedade civil contra o regime e tornou Herzog símbolo da liberdade de pensamento e de imprensa no país. A nomeação de Herzog como diretor do canal de televisão pública do Estado de São Paulo pelo secretário de Cultura José Mindlin foi aprovada pelos órgãos de segurança do regime militar e pelo governador Paulo Egydio antes de sua contratação. Mesmo assim, a chamada linha dura do governo militar fazia campanha com a conhecida cantilena de “infiltração esquerdista” contra a equipe liderada por Herzog através do jornalista Claudio Marques, do Shopping News, praticamente porta-voz dos setores de informação do governo. LEIA TAMBÉM “10 músicas contra a ditadura militar”  Vladimir Herzog nasceu Vlado Herzog em 27 de junho de 1937 em Osijek, hoje a quarta maior cidade da Croácia e morreu há 40 anos, em 25 de outubro de 1975. O apoio da grande mídia ao golpe de 64 O momento político da morte do jornalista foi marcado por uma disputa pelo poder entre a linha dura do exército e setores da ditadura que pretendiam estabelecer certo diálogo com a sociedade civil. Três meses depois de Herzog, em janeiro de 1976, o metalúrgico Manoel Fiel Filho também foi assassinado pelo governo e o ditador Geisel destituiu o comandante do II Exército, general Ednardo D’Ávila Mello, um dos principais líderes da chamada linha dura entre os militares. Políticos também insuflavam os militares da linha dura para a perseguição aos jornalistas da TV Cultura. O deputado da ARENA (partido do governo), José Maria Marin, que atualmente está preso na Suíça por corrupção como dirigente de futebol, pediu um aparte ao discurso do deputado do mesmo partido, Wadih Helu, futuro presidente do Corinthians, na Assembleia Legislativa de São Paulo e exigiu “providências aos órgãos competentes em relação ao que está acontecendo no canal 2 [TV Cultura…]”, que, segundo ele “sofria infiltração de elementos comunistas”. Este blog já abordou a trajetória da triste figura José Maria Marin. Episódio narrado no livro Bendito Maldito, ótima biografia de Plínio Marcos escrita por Oswaldo Mendes, mostra o nível da truculência dos militares. O diretor Ademar Guerra enfureceu um coronel ao escalar o “subversivo” Plínio como São Francisco de Assis em um teleteatro produzido na TV Cultura. Guerra relembra o tumulto naquele 24 de outubro no departamento de jornalismo da emissora: “o clima era de muito medo”. No meio desse clima de incerteza, ele lembra no livro que “alguém disse que um coronel do 2º Exército tinha telefonado à minha procura”. O diálogo de Guerra com o coronel: – Por que o senhor está fazendo a história de São Francisco? – Porque é uma história bonita, a história de um santo… – Mas é perigoso… – O que há de perigoso na história de um santo, coronel? Quer que eu mande o texto para o senhor ler? – Não quero ler nada, não.  Ademar Guerra escapou da brutalidade que vitimou Herzog. O jornalista Leandro Konder, amigo do jornalista assassinado e também detido pelos militares, não e também foi torturado. Ele relata o sofrimento de Vlado nas mãos dos torturadores do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna): “podíamos ouvir nitidamente os gritos, primeiro do interrogador, depois, de Vladimir, e ouvimos quando o interrogador pediu que lhe trouxessem “pimentinha” [máquina de choques elétricos para tortura] e solicitou ajuda de uma equipe de torturadores. Alguém ligou o rádio e os gritos de Vladimir confundiam-se com o som do rádio. Lembro-me bem que durante essa fase, o rádio dava notícia de que Franco [ditador espanhol] havia recebido a extrema-unção, e o fato me ficou gravado, pois naquele mesmo momento Vladimir estava sendo torturado e gritava. A partir de um determinado momento, o som da voz de Vladimir se modificou, como se tivessem introduzido coisa em sua boca; sua voz ficou abafada como se lhe tivessem posto uma mordaça. Mais tarde, os ruídos cessaram” (trecho do depoimento de Leandro Konder no livro “Brasil nunca mais”).   Não satisfeitos, os agentes da ditadura forjaram a cena de um suposto suicídio de Vlado “em um surto de arrependimento”, a foto divulgada pelos órgãos de repressão ainda mostra um bilhete rasgado com “a confissão de seu envolvimento com os comunistas”. Amigos, familiares e a comunidade judaica não aceitaram a inverossímil versão do governo sobre a morte do jornalista, que era judeu, e o enterraram no centro da Sociedade Cemitério Israelita. Pela tradição dos judeus, os suicidas são enterrados em uma área específica. A imprensa alternativa teve papel importante para desmontar a versão oficial do governo. O jornalista Mylton Severiano relata no documentário Resistir é Preciso como ele, Narciso Kalili e Hamilton Almeida Filho produziram uma detalhada matéria de 8 páginas sobre o assassinato de Vlado para o jornal EX-. O título foi retirado do Hino à República: “Liberdade Liberdade abre as asas sobre nós”. A edição de 50 mil exemplares esgotou

O renascimento do Jango antropofágico

Bem-vindo ao Fatos da Zona, em que adaptamos os textos mais acessados do site do Zonacurva Mídia Livre. Neste vídeo, mergulhamos na vida e na trajetória política do presidente João Goulart, líder progressista que enfrentou desafios e lutou incansavelmente por justiça social no Brasil. Conheça a história desse presidente popular e suas políticas transformadoras que buscavam garantir direitos trabalhistas e combater as desigualdades.   JANGO – Em Jango uma tragedya, texto teatral de Glauber Rocha de 1974, Jango é devorado pelo povo em ritual antropofágico no carnaval depois de sua morte. O delírio de Glauber embute o desejo do renascimento de um novo Jango, de corpo fechado para enfrentar os Antonios das Mortes, jagunço icônico do cineasta, que o derrubaram nos idos de 1964, e continuam à espreita. Para entender nossa miséria, incluo por minha conta e risco a miséria cognitiva e intelectual, Glauber ia além da racionalidade e da luta de classes. A religiosidade e os meandros mágicos do inconsciente desse povo único que é o nosso eram o caminho para o entendimento de nossa mente ainda colonizada. Era como se o atávico complexo de inferioridade e a necessidade masoquista de auto-imolação pudessem ser expurgados por deuses negros e índios em rituais de libertação. “Nas crenças religiosas e nas práticas mágicas, a que o negro se apegava no esforço ingente por consolar-se do seu destino e para controlar as ameaças do mundo azaroso em que submergia“ (Darcy Ribeiro, no livro “O Povo Brasileiro”). Fascinado por Jango, Glauber escreve em suas andanças pelo mundo pedindo que o professor Darcy Ribeiro, que foi ministro da Educação e da Casa Civil de João Goulart, lhe esclarecesse os reais motivos da queda do presidente em 64. Darcy responde do Chile em 1972: “a política do governo Jango, sendo encarada pelas classes dominantes como revolucionária (porque a execução da Reforma Agrária e da Lei de Remessa de Lucros parecia inevitável se Jango se mantivesse no poder), provocou a contra-revolução, por parte dos interessados em manter a velha ordem” (trecho do livro Cartas ao Mundo, de Glauber Rocha, organizado por Ivana Bentes). Após o golpe, o general Castelo Branco revogou a lei que controlava a remessa de lucros das multinacionais para o exterior. Em pesquisa IBOPE de março de 1964, 59% da população era favorável às reformas de Jango e 45% dos brasileiros cravavam bom e ótimo na avaliação do governo João Goulart. Os dólares (agora euros também) que circulam para comprar políticos e diretores de estatais, cooptados por empresários sonegadores com expertise em maracutaias, já encheram em tempos idos o bolso do general Amaury Kruel, comandante do II Exército e militar de confiança de Jango. Kruel, um dos artífices do dispositivo militar que seguraria os avanços das forças da direita, trocou seu apoio por maletas de verdinhas, entregues pela burguesia paulista, que sempre soube proteger seus interesses. Se o jogo melar, a Suíça é logo ali. https://www.zonacurva.com.br/como-o-general-lott-garantiu-a-posse-de-jk-e-jango-em-1955/ O filho de Jango, João Vicente Goulart defende o pai e questiona por que os outros agentes da esquerda do jogo político da época também não reagiram.  “Eu acho uma grande injustiça histórica só perguntar por que Jango não resistiu, podemos perguntar também por que o Partido Comunista não resistiu, por que os sindicatos não resistiram, por que as organizações de base não resistiram e por que a Frente Nacionalista que pressionava tanto e queria as reformas de base na marra, fora da legalidade, não resistiu”. Ele próprio responde: “não havia condições de resistência… Nós teríamos um Brasil dividido em dois”. Hoje estamos divididos novamente em dois e a esquerda perplexa assiste ao avanço da direita e da extrema-direita nos protestos em que PMs são subcelebridades cultuadas em selfies. A falência cognitiva dos humanos direitos vitaminou a polícia para o espancamento de professores e “vândalos” (identificados a critério dos interesses da velha mídia). A fórmula simplória do atual discurso de muitos que pulula nas redes antissociais: professor = vagabundo = drogado. Marighella, o Che baiano, revoltou-se com a falta de reação de Jango ao golpe e desabafou com o filho que “Jango era frouxo”, conforme está escrito na ótima biografia de Marighella, do jornalista Mario Magalhães. Para o indignado Marighella, era inconcebível que Jango não lutasse contra os usurpadores de seu mandato. Imagino o guerrilheiro baiano vociferando contra a política praticada hoje em prol dos interesses do empresariado, do agronegócio e dos bancos. O guru do Méier, Millôr Fernandes dizia que “todos os países são difíceis de governar, só o Brasil é impossível”, tem horas que concordo, não quero, mas concordo.   https://urutaurpg.com.br/siteluis/jango-no-comicio-que-mudou-o-destino-do-pais/

O apoio da grande mídia ao golpe de 64

Golpe de 64 – Além de criar o clima de pânico, em especial na classe média, que passou a aceitar a quebra do Estado democrático, a imprensa apoiou o golpe de 1964 de maneira quase unânime. O livro Cães de Guarda – jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988, da historiadora Beatriz Kushnir, lançado em 2004, e infelizmente pouco conhecido, pesquisou a atuação da imprensa no período da ditadura militar e mostra em cores fortes como as principais empresas de mídia da época (Folha de S. Paulo, O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil, Globo e o Correio da Manhã) foram coniventes com o regime. A exceção entre os principais grupos de comunicação do período ficou por conta do Última Hora, jornal criado pelo jornalista Samuel Wainer em 1951. Única voz entre os principais jornais que deu suporte a João Goulart e suas reformas de base, o Última Hora foi praticamente destruído pelos militares após o golpe. Antes disso, o jornal chegou a vender um total de 500 mil exemplares por dia de suas 11 diferentes edições regionalizadas. Kushnir declarou recentemente à revista Carta Capital: “eu reviso essa ideia de resistência e mostro que houve, no lugar disso, um grande colaboracionismo, se houve resistência, está nos veículos alternativos e não na grande imprensa”. O bunker contra a ditadura militar se encontrava mesmo em publicações como Pasquim, Opinião, Movimento, Bondinho, Versus e muitas outras. Em euforia, o editorial do Globo de 2 de abril de 1964 celebrou a tomada do poder pelos militares com o título “Ressurge a Democracia”,  Roberto Marinho vibrava com o golpe militar em seu jornal: “salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares que os protegeram de seus inimigos. Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais”. O jornalista Cláudio Abramo que chegou a ocupar a direção do jornal Folha de S. Paulo lembra do clima de março de 64: “Alertei [Darcy Ribeiro, figura próxima a Jango] de que dias antes o dr. Julinho [do jornal O Estado de São Paulo] havia visitado Assis Chateaubriand [conhecido barão da mídia, dono dos Diários Associados], e que aquilo era sinal seguro de que o golpe estava na rua. Porque a burguesia é muito atilada nessas coisas, não tem os preconceitos pueris da esquerda. Na hora H ela se une”. (trecho do livro “A Regra do Jogo” de Abramo)  Em 1977, Cláudio Abramo foi afastado da direção da Folha de S. Paulo atendendo a pressões do ministro do Exército, Sylvio Frota, contra a publicação de uma crônica de Lourenço Diaféria no 7 de setembro e tida pelos militares como ofensiva à memória do Duque de Caxias. Abramo chama em seu livro  o outro jornal do Grupo Folha, a Folha da Tarde, de “jornal sórdido”. Kushnir se debruçou sobre a história da Folha da Tarde. O FT mudou radicalmente de lado com a edição do AI-5. Até 1968 era um jornal inquieto, que concorria diretamente com o irmão mais novo do Estadão, o Jornal da Tarde. A Folha da Tarde foi criada em 1º de julho de 1949 com o slogan “o vespertino das multidões”. Durante uma década e meia sob o comando de policiais, a Folha da Tarde foi apelidada de a de “maior tiragem”. Os jornalistas-tiras, chamados de cães de guarda por Kushnir, que trabalharam por lá, tinham jornada dupla na Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. Eles “legalizavam” as mortes decorrentes da tortura em seu trabalho na redação, noticiando-as como assassinatos em trocas de tiros. Com informações de dentro do aparelho repressor, a Folha da Tarde chegou ao absurdo de antecipar em suas manchetes algumas mortes de militantes. O outro codinome do FT na época era o Diário Oficial da Oban (Operação Bandeirante). A Oban foi um centro de informações e tortura montado pelo exército para coordenar a repressão e deu origem ao famigerado Doi-Codi (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna) que, em São Paulo, na rua Tutóia, torturou e matou muitos opositores ao regime. O relatório da Comissão Nacional da Verdade, divulgado na semana passada, confirma os estudos de Kushnir e declara que o Grupo Folha forneceu apoio financeiro, ideológico e material à repressão e que veículos do jornal foram utilizados pelos militares responsáveis pela repressão.   “É a história de 64. A mídia começou a implorar o golpe desde 62. Tão logo o João Goulart assumiu o lugar do senhor Jânio Quadros, inventaram o parlamentarismo, aquela coisa grotesca. Desde aquele momento, a mídia começou a querer… E quem estava  bravo aparentemente, onde estava a espuma? Nos quartéis. Então são eles que vão fazer o serviço sujo. Mas quem pensa que o golpe foi militar, a meu ver, está enganado. O golpe foi desse poder que está aí até hoje. Até hoje. Os militares são os gendarmes que executam o serviço. Depois de um certo momento, eles até gostaram do poder. O poder empolga.”  (jornalista Mino Carta, em entrevista à Revista Caros Amigos número 105, de dezembro de 2005) Nos dias 21/9/1971 e 25/10/1971, carros do Grupo Folha da Manhã foram incendiados por militantes de esquerda. A ação foi uma represália à empresa por ceder automóveis ao Doi-Codi que, com esse disfarce, tinha facilitado seu trabalho de criar emboscadas para a prisão de ativistas. Em editorial na Folha da Tarde e Folha de S. Paulo no dia 22 de setembro de 1971, a Folha se defendeu atacando ‘os que procuram disfarçar sua marginalidade sob o rótulo de idealismo político’ e que ‘da opinião pública, o terror só recebe repúdio’ e emendou loas ao regime: “como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, e com indiscutível apoio popular, está levando o Brasil pelos seguros

Como ministro de Vargas, Jango revelou as entranhas do Brasil

Bem-vindo ao Fatos da Zona, em que adaptamos os textos mais acessados do site do Zonacurva Mídia Livre. Neste vídeo, mergulhamos na vida e na trajetória política do presidente João Goulart, líder progressista que enfrentou desafios e lutou incansavelmente por justiça social no Brasil. Conheça a história desse presidente popular e suas políticas transformadoras que buscavam garantir direitos trabalhistas e combater as desigualdades.   Jango – Com apenas 34 anos, João Goulart assume o relevante à época Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em junho de 1953, no governo Getúlio Vargas, e passa a receber em seu gabinete pessoas humildes e sindicalistas, muitos deles negros. A reação a nomeação do ministro foi imediata: empresários, militares e imprensa passam a orquestrar uma verdadeira campanha para derrubá-lo. O mandato de Jango como ministro durou apenas 8 meses e mostrou como a proximidade de trabalhadores à esfera do poder politico incomoda uma camada de privilegiados que enxerga o Estado como sua propriedade. Hoje o duro enfrentamento que veio à tona a poucos dias do segundo turno da eleição presidencial demonstra, apesar de nosso considerável amadurecimento democrático das últimas duas décadas, como a sociedade brasileira ainda não equalizou muitas de suas contradições. A oposição a Jango ainda está à espreita e metamorfoseou-se em defensora do MERCADO como a tábua de salvação de nossos ainda sérios problemas. Em 1953, a principal proposta do ministro previa aumento que dobrava o salário mínimo para 2.400 cruzeiros. A virulenta reação da oposição, principalmente dos quartéis, assustou o governo. Para evitar riscos ao mandato de Getúlio, seu padrinho político, João Goulart deixa o ministério em fevereiro de 54 e declara: “os trabalhadores podem ficar tranquilos, porque prosseguirei ao lado deles, mudando apenas de trincheira”. Em primeiro de maio (Dia do Trabalho) do mesmo ano, três meses antes do suicídio, Getúlio dobra o salário mínimo. “Os detratores das classes operárias não compreendem que um ministro de Estado possa falar com espontaneidade e estabelecer laços de afeto com criaturas de condição humilde… enquanto uns estão ameaçados e morrem mesmo de fome, outros ganham num ano aquilo que normalmente deveriam ganhar em 50 anos e até mesmo em um século” (JANGO) Jango alterou as relações entre Estado, classe trabalhadora e empresários. Com isso, os coronéis lançaram manifesto contra ele, os empresários enfureceram-se e a imprensa o atacou. Jango enfrentou a acusação da oposição de maquinar, com a ajuda do presidente argentino na época, Juan Domingo Perón, a implantação da República Sindicalista no Brasil. O jornalista Carlos Lacerda atacava o governo em seu jornal Tribuna da Imprensa. Em surtos de verdadeira psicose, conclamava o Congresso e a opinião pública a reagir contra “a República Sindicalista, a esdrúxula república jangueira, que fará do Sr. Getúlio Vargas, amorfo e dócil homem de quase 80 anos, mal vividos, um ditador que cochila, enquanto Jango age”. O barão das comunicações e à época senador, Assis Chateaubriand, subiu à tribuna do Congresso e disparou: “o político rio-grandense não faz outra coisa senão desenvolver a mais cruel e atormentada luta de classes até hoje vista. Nem o Partido Comunista já produziu uma campanha de atrito de classes tão perfeita, com o colorido que o Sr. Goulart tem desenvolvido”. Em pouco tempo no ministério, Jango conquistou a simpatia dos trabalhadores e passou a mediar inúmeras negociações entre empregados e patrões, o que era inédito na época. Em alguns casos, o ministro até chegava a estimular as mobilizações por melhores condições de trabalho. Em março de 53, a chamada greve dos 300 mil agitou São Paulo e fez surgir o Pacto de Unidade Intersindical (PUI), organização não alinhada à estrutura sindical pelega, comum à época. Em junho, a greve dos marítimos, inaugurou uma estratégia de negociação entre governo e sindicatos. Ao mesmo tempo, desencadeou o temor de muitos, a começar pelo ministro da Fazenda, Oswaldo Aranha, defensor de uma política de contenção de gastos e crítico de qualquer elevação salarial. O I Congresso de Previdência Social no Rio de Janeiro reuniu representantes de todo o país e estabeleceu um maior acesso dos sindicatos aos serviços assistenciais da previdência, além de um maior acesso dos sindicalistas (e também dos petebistas, partido de Jango) aos cargos da administração dos inúmeros Institutos de Pensões e Aposentadorias. A paciência e simplicidade de Goulart davam o tom para longas conversas com diversas lideranças sindicais, empresariais e políticas. Sua jornada estafante de trabalho começava às dez da manhã e terminava no meio da madrugada. Em outubro de 1953, Jango viajou pelo Norte e Nordeste do país e visitou inúmeros sindicatos. No retorno, 78 sindicatos tinham organizado uma recepção consagradora. Cerca de 4 mil pessoas o esperavam no aeroporto do Rio e o celebraram, Jango teve que subir na capota de um carro para que todos o vissem. Goulart mostrou indignação com as condições de trabalho daquela região do Brasil e relatou que havia trabalhadores com jornadas de 30 dias por mês, sem um único dia de descanso. Como pagamento, recebiam 10 quilos de farinha ou 15 de carne. “Acabo de percorrer vários Estados do Norte e do Nordeste e senti de perto a miséria e as privações dos nossos irmãos daquelas plagas. Ouvi trabalhadores de todas as categorias. Esses trabalhadores que vivem abandonados e sem o mínimo conforto” (Jango) Apesar dos esforços de Goulart e do governo, a crise econômica e a inflação deflagraram várias greves no segundo semestre de 1953. No congresso, integrantes da bancada da UDN (União Democrática Nacional), partido de oposição, chamada ironicamente de ‘banda de música’, subiam ao palanque inúmeras vezes para atacar o governo de Getúlio Vargas e em particular, Jango. Não resta dúvida de que a atuação de Jango no Ministério aproximou setores reacionários das Forças Armadas à UDN. O trabalho de Jango no governo colaborou para transformar Getúlio Vargas do ditador do Estado Novo em um líder de massas. Ambos se aproximaram quando Getúlio, após sofrer o golpe de 45, vivia na Estância Itu, a 80 quilômetros de São Borja (RS), terra natal de Getúlio e João Goulart. Isolado,

Romeu Tuma Jr. depõe no caso do sumiço de Edgar Duarte

por Thais Barreto Edgar Duarte – Na tarde de terça-feira (30/9) aconteceu mais uma sessão da Ação Penal n.º 0011580-69.2012.403.6181, movida pelo Ministério Público Federal, que apura o desaparecimento de Edgar Aquino Duarte. O militante passou pelo DOI-Codi e foi visto pela última vez no prédio do DOPS do centro de São Paulo, em junho de 1973. São réus os delegados de polícia Carlos Alberto Augusto — o “Carlinhos Metralha” — e Alcides Singillo, além do coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra. Embora arrolado anteriormente pela defesa de dois réus, Tuma Jr. prestou depoimento como testemunha do juízo, de acordo a magistrada Adriana Delboni Taricco, que também ouviu o delegado de polícia José Sanches Severo. Um documento que relata como foi a sessão realizada nos dias 27 de março, 1º e 2 de abril deste ano revela detalhes do andamento da ação penal. Alcides Singilo não compareceu à sessão do primeiro semestre. A defesa alegou que o réu estava com problemas de saúde, internado em uma UTI. Foi requisitada nova sessão, para que Singilo pudesse acompanhar os depoimentos.   O documento diz: “Dada a palavra às partes foi dito que, as defesas pediam reconsideração ao indeferimento da oitiva do sr. Romeu Tuma Júnior e das testemunhas arroladas pelo sr. Alcides Singillo ouvidas sem a presença dele”. Os depoimentos desta terça foram acompanhados pelo procurador da República Márcio Schusterschitz da Silva Araújo. O primeiro a ser ouvido foi José Sanches Severo, através de videoconferência transmitida desde Araçatuba, no interior de São Paulo, onde ele exerce cargo de delegado de polícia. O procurador da República perguntou se Severo havia exercido alguma função pública entre 1964 e 1985. A juíza federal perguntou se ele conheceu Edgar de Aquino Duarte. Para as duas indagações, o delegado respondeu que não. Disse ainda que ingressou na polícia em 1986, fora do período coberto pela investigação do desaparecimento de Edgar, objeto da ação do MPF. Severo afirmou também que não trabalhou no DOPS — o Departamento de Ordem Política e Social — de São Paulo e que conheceu Alcides Singilo apenas em 1995. No depoimento de Romeu Tuma Jr., a juíza federal Adriana Delboni Taricco disse que ele estava na sessão como “testemunha do juízo”. Outra ata a que tivemos acesso indica que Tuma Jr. também foi arrolado pela defesa do réu Carlos Alberto Augusto. “Tendo em vista que há prazo e lapso de tempo suficiente, não me oponho a oitiva de Romeu Tuma Júnior, caso a defesa de Carlos Alberto Augusto apresente endereço atualizado, visando evitar futuras nulidades”, diz o documento. Na sessão, a juíza Adriana determinou à defesa que as perguntas a Romeu Tuma Jr. cobrissem apenas o período que corresponde ao sequestro e desaparecimento de Edgar Aquino Duarte, de 1971 a 1973. Ao depor, Tuma Jr. disse que nasceu em 1960 e, naquele período, tinha entre 10 e 13 anos. Afirmou também que entrou na polícia apenas em 1978. O ex-Secretário Nacional de Justiça do governo Lula se aposentou como “delegado classe especial” da polícia paulista em 2013. O pai dele, o falecido Romeu Tuma, foi senador por São Paulo. Antes, dirigiu o DOPS paulista entre 1977 e 1982 e a Polícia Federal entre 1982 e 1985, durante os governos ditatoriais de Ernesto Geisel e João Figueiredo. “No DOPS havia sim um delegado responsável pela carceragem”, respondeu Tuma Jr., que ingressou na polícia paulista como investigador quando seu pai dirigia o DOPS. Ele afirmou também ter trabalhado, posteriormente ao período investigado, próximo a Alcides Singillo, mas em departamentos diferentes. O mesmo advogado perguntou se Tuma conhecia o ex-preso político Ivan Seixas. Resposta: “apenas de nome”. A defesa se referiu a Ivan Seixas porque ele é uma das testemunhas de acusação na ação do MPF. Seixas estava preso no DOPS e conheceu Edgar Aquino Duarte. Na sessão realizada em dezembro de 2013, o ex-preso político disse ter escutado um comentário de Edgar, que ao ver Carlinhos Metralha — apelido de Carlos Alberto Augusto –, quando este passava em frente à cela, disse: “Esse foi um dos que me prenderam”. O procurador da República, Márcio Schusterschitz da Silva Araújo, também perguntou se Tuma Jr. sabia de alguma ligação entre o DOI-Codi e o DOPS de São Paulo. Romeu Tuma Jr. disse que não saber se havia conexão formal entre o DOI-Codi e o DOPS. O Destacamento de Operações de Informações — Centro de Operações de Defesa Interna foi criado pelo Exército para o combate aos grupos que se organizaram para resistir à ditadura. Foi antecedido pela Operação Bandeirante, a OBAN, que envolveu militares e policiais civis paulistas, financiados por empresários, num esforço conjunto que resultou no sequestro, prisão, tortura e morte de dezenas de militantes. A OBAN importou técnicas de tortura que haviam sido desenvolvidas por militares dos Estados Unidos na guerra do Vietnã e por militares franceses durante a guerra de independência da Argélia. O prédio onde o DOI-Codi funcionou em São Paulo, na rua Tutoia, foi recentemente tombado pelo patrimônio público. A delegacia de polícia que funciona lá deverá dar lugar a um museu. Vários presos que foram torturados no DOI-Codi foram posteriormente transferidos para o DOPS, segundo depoimento deles. Foi o caso de Ivan Seixas, por exemplo. Com a oitiva de Tuma, resta uma testemunha importante a ser ouvida: Michel Temer, atual vice-presidente da República, ex-secretário da Segurança Públlica de São Paulo. A pedido da juíza, as respostas de Temer serão enviadas por escrito. Após o recebimento, será possível marcar a data da sessão que ouvirá os réus. Estarão presentes Carlos Alberto Augusto e Alcides Singilo. Os representantes da defesa de Carlos Alberto Brilhante Ustra pediram que o depoimento dele seja dado através de videoconferência. A expectativa é de que a sessão seja realizada até dezembro. Edgar Aquino Duarte teve sua carreira de marinheiro interrompida em 1964 por participar da revolta ocorrida no calor do golpe militar. Foi expulso da corporação e teve que se exilar – primeiro no México, depois em Cuba. Edgar voltou ao Brasil em 1968, adotou outro nome e a função de corretor na