Zona Curva

Memória

Um povo sem memória é um povo sem história.

O mundo despertou do pesadelo neoliberal em Seattle

Em 30 de novembro de 1999, ministros e políticos de 135 países foram convidados para a chamada Rodada do Milênio, terceiro encontro mundial da OMC (Organização Mundial do Comércio) em Seattle (EUA). Só não contavam com a presença de 50 mil manifestantes, que não precisaram de convite, para clamar por uma economia mais solidária durante os quatro dias do encontro, que pretendia estabelecer as regras comerciais do século 21. Os protestos em Seattle, cidade até então mais conhecida como o berço do novo rock dos anos 90, entraram para a história como a primeira grande manifestação contra o capitalismo neoliberal globalizado. A devoção pelo mercado, que dominou o cenário mundial nos anos 80 e 90, gerou mais concentração de poder nas mãos de algumas corporações e ainda mais empobrecimento em países da periferia do capitalismo. A pluralidade da pauta dos manifestantes iam da luta contra o trabalho infantil e semi-escravo particularmente em países pobres, os alimentos transgênicos e a destruição do meio ambiente. Formada por trabalhadores, anarquistas e estudantes, o movimento foi batizado a grosso modo de movimento antiglobalização.  “Se o século 20 terminou com a queda do muro de Berlim, o século 21 começou com Seattle” (sociólogo francês Edgar Morin) Na manhã do dia 30 de novembro, o movimento colocou em ação sua estratégia conhecida como Rede de Ação Direta que visava impedir a chegada dos participantes nas reuniões no centro da cidade. Para isso, os manifestantes congestionaram os principais entroncamentos viários do downtown de Seattle. Também foi adotada a tática do sit-in, grupos que sentavam no meio da rua impedindo a circulação de veículos. A polícia de Seattle reagiu com gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha na tentativa de garantir a chegada dos delegados da OMC ao encontro, alguns manifestantes mais radicais reagiram com depredações de lojas, o que criou um clima de confronto nas ruas da cidade. Nesse momento, houve um racha entre anarquistas black blocs e os partidários da não-violência do movimento, com a união dos participantes em torno do espírito pacifista. No frigir dos ovos, a manifestação recebeu solidariedade de movimentos semelhantes em várias outras cidades do mundo. A reunião da OMC foi um fracasso e vários representantes de países periféricos do capitalismo praticamente abandonaram o encontro. Foi ali também que um novo modelo de mídia independente começou a tomar forma. O Indymedia, recém criado em um encontro de imprensa alternativa na cidade de São Francisco, na Califórnia, cobriu os protestos e cravou a incrível marca de um milhão de acessos diários. O Indymedia nasceu como um banco de dados em que jornalistas (ou não) de veículos alternativos poderiam publicar vídeos, imagens e textos em cooperação mútua e depois espalhou-se com sites em vários países. As manifestações em Seattle foram o pontapé inicial para outras manifestações em reuniões de líderes do poder global. O tempo estendeu a luta contra a austeridade proposta pelo FMI e o Banco Mundial na reunião do G8 (oito nações mais poderosas do mundo) em Gênova, na Itália, e aos Fóruns Sociais Mundiais de Porto Alegre e Mumbai, na Índia. Documentário Surplus investiga o consumismo Líderes e delegados de diversos países vieram para Seattle para “discutir questões como subsídios agrícolas, vendas de produtos no exterior (conhecidas como “dumping”) e outras questões comerciais. Nos dias que se seguiram, contudo, os dramáticos protestos conseguiram não apenas impedir que os delegados da OMC levassem a bom termo seu encontro, produzindo uma declaração final para a reunião de cúpula, como ainda roubaram as manchetes dos presidentes, primeiros-ministros e delegados oficiais. Sob os holofotes do palco montado pela mídia global, as ruas de Seattle foram tomadas por uma batalha em torno da nova ordem global. Seattle foi o primeiro protesto global” (extraído de “Multidão – Guerra e Democracia na era do Império de Michael Hardt e Antonio Negri). Em 2000, o documentário “Essa é a cara da democracia” (This is What Democracy Looks Like), da produtora de mídia radical Big Noise Films, organizou imagens captadas por mais de 100 ativistas, e contou como foram os protestos in loco. Assista: https://www.youtube.com/watch?v=jsTu4UDYPmE Anonymous foi o nó que desatou os protestos em 2013  

Canudos não se rende

Canudos – O dia 5 de outubro data a queda do arraial de Canudos, no sertão da Bahia, sobre o qual Euclides da Cunha escreveria a tragédia inaugural da República brasileira e Cesar Zama desnudaria os fatores envolvidos para dizimar o povoado, erguido na fazenda abandonada de Garcia D’Ávila. Se considerarmos as permanentes tentativas retrógadas frente ao avanço social no país, é correto afirmar o quanto a primeira crise da República está de volta. Canudos não se rende. O dramático extermínio da experiência pioneira de uma comunidade popular, sob o comando do beato Antônio Conselheiro, após rechaçar os ataques de três expedições do Exército, entre 1896 e 1897, levada a efeito pelo novo regime implantado no País, permanece irresolúvel na consciência dos brasileiros. Com o relato de Euclides da Cunha, ao narrar parte de toda a epopeia em Os Sertões, sendo contestado em inúmeros aspectos por diversos autores, é inevitável compreender o quanto, antes, o Brasil era Canudos. Hoje, Canudos é o Brasil. O território, palco daquela aventura mística e bélica, permanece vivo na contemporaneidade, ainda que submerso para dar lugar ao açude de Cocorobó, em 1966. Os integrantes do Arraial de Canudos resistiram até o dia 5 de outubro de 1897. Quem quiser interpretar, à luz da história, a guerra travada em quatro intermitentes batalhas entre os seguidores do beato Antônio Conselheiro e os cinco mil soldados do Exército, precisará trazer à memória o mais sangrento dos conflitos já ocorridos no Brasil. Um episódio cujo paralelo histórico (e estético) é localizável em Guernica, cidade destruída por aviões alemães durante a guerra civil espanhola, 40 anos mais tarde, e que viria a ser uma das significativas obras do pintor Pablo Picasso. Contudo, conforme o escritor César Zama, baiano de Caetité, nos permitiria salientar pelo artigo publicado no Diário da Bahia, em 1899, “a justiça estadual não se ocupava dos habitantes daquele arraial. Contra eles não havia instaurado processo algum. Nos cartórios do Estado nenhum deles tinha o seu nome no rol dos culpados. Nada de extraordinário se passava com relação a Antonio Conselheiro e aqueles que o acompanhavam”. Ao denunciar o genocídio, Zama faz ver o quanto “ninguém ignora que gênero de vida levavam os canudenses: plantavam, colhiam, criavam, edificavam e rezavam. Rudes, ignorantes, fanáticos talvez pelo seu chefe, que reputavam santo, não se preocupavam absolutamente de política. Antonio Conselheiro, porém, confessava-se monarquista. Era seu direito, direito sagrado, que ninguém podia contestar em um regime republicano democrático. Não há ato algum por sua parte ou dos seus que fizesse ao menos presumir que ele tentasse contra o governo da República”. As desobediências civis à cobrança de impostos e ao casamento civil instituído pela Constituição de 1891 faziam parte da sua pregação, iniciada por volta de 1870 ao promover mutirões para a construção de igrejas e cemitérios no interior do Nordeste. O atraso na entrega de madeira, adquirida em Juazeiro, para a construção de um templo no arraial, 26 anos depois, se converteria em revolta e no estopim para a mancha negra que se incrustaria na história republicana. Em meio ao disparate da mobilização das forças expedicionárias para combater a crença e a fé de uma comunidade que compunha a segunda maior concentração populacional da Bahia, após a capital, com cerca de 25 mil habitantes, vale, ainda, registrar o episódio da rendição de milhares desses habitantes. A negociação coube ao braço direito de Conselheiro, o Beatinho. Ergueu bandeira branca e dirigiu-se à negociação. Chegado à presença do general Arthur Oscar expôs-lhe o propósito: “venho declarar-vos que grande número de meus companheiros estão dispostos a render-se, contanto que V. Exa. lhes garanta a vida” foram a suma de suas palavras. “Sob minha palavra de honra prometo que as suas vidas serão respeitadas: podem vir tranquilos.” Responde-lhe o chefe das forças legais. Mas o que ocorreria com a rendição, senão a degola de todos, homens, mulheres, crianças, para supor um heroísmo desmerecido? Sim, Canudos permanece vivo.

A importância de Steve Biko e do Movimento de Consciência Negra na África do Sul

por Milton Ribeiro (do portal Sul21) BIKO -Stephen Bantu Biko, ou Steve Biko, nasceu em 18 de dezembro de 1946 e morreu em 12 de setembro de 1977, aos 30 anos, após ser preso e torturado. Ativista anti-apartheid da África do Sul na década de 1960 e 1970, Biko não faz somente parte da memória política da África do Sul, mas também da memória da cultura ocidental. O Movimento da Consciência Negra de Biko agregou para si o slogan Black is Beautiful, que nos Estados Unidos destinava-se a dissipar a noção de que as características físicas dos negros — como cor da pele, detalhes do rosto e cabelos — seriam feias. O movimento também incentivava homens e mulheres a pararem de esconder seus traços afros alisando o cabelo, clareando a pele, etc. Porém, na África do Sul, a luta análoga era outra, muito mais básica, e o Black is Beautiful de Biko significava algo como “você tem que olhar para si mesmo como um ser humano e aceitar a si mesmo como você é”. A música brasileira homenageou o movimento norte-americano através da belíssima canção homônima dos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle, famosa na versão de Elis Regina. O roqueiro inglês Peter Gabriel foi mais direto e escreveu Biko, verdadeiro hino cujas primeiras palavras são September ’77 / Port Elizabeth weather fine / It was business as usual / In police room 619. Mas tais referências culturais são apenas ornamentos para a vida de um grande mobilizador da população negra sul-africana. As muitas organizações fundadas por Biko iam no caminho inverso das lições de inferioridade racial ministradas aos negros por ordem do governo da África do Sul. Ele desejava que os negros tivessem consciência de suas capacidades, que pudessem ocupar cargos destinados apenas aos negros, além do fim da educação limitada, pois muitas disciplinas simplesmente não podiam ser ministradas aos negros do país. Em 18 de agosto de 1977, Biko foi preso em uma barreira policial e interrogado por oficiais da polícia. Esse interrogatório ocorreu na sala de polícia nº 619 do Edifício Sanlam em Port Elizabeth. O interrogatório durou 22 horas e incluiu tortura e espancamentos, resultando em coma. Ele sofreu graves ferimentos na cabeça e, após as torturas, foi acorrentado às grades de uma janela durante um dia inteiro. Dias depois, em 11 de setembro de 1977, a polícia resolveu levá-lo, nu e algemado, para uma prisão com instalações hospitalares, mas ele morreu logo após chegar, em 12 de setembro. A polícia divulgou que sua morte foi resultado de uma prolongada greve de fome, mas a autópsia revelou múltiplas contusões e escoriações. Seu fim deveu-se a uma hemorragia cerebral. O jornalista Donald Woods, editor e amigo de Biko, e Helen Zille, mais tarde líder do partido político da Aliança Democrática, expuseram a verdade sobre sua morte. A notícia espalhou-se rapidamente. O funeral foi assistido por mais de 10 mil pessoas, incluindo numerosos embaixadores e outros diplomatas da Europa Ocidental e dos Estados Unidos. O mesmo Donald Woods fotografou seus ferimentos no necrotério. Woods foi mais tarde forçado ao exílio, passando a fazer campanha contra o apartheid na Inglaterra. Também foi autor do livro Biko, mais tarde transformado no filme Cry Freedom, de Richard Attenborough, com Denzel Washington no papel de Biko. Em 1978, a Justiça sul-africana decidiu que não havia provas suficientes para acusar os oficiais de homicídio. Faltariam testemunhas. E, em outubro de 2003, o Ministério da Justiça Sul-Africano anunciou que os cinco policiais acusados de matar Biko não seriam processados também em razão de insuficiência de provas. Steve Biko nasceu em Ginsberg, bairro de King Williams Town. O nome do bairro é o do dono da fábrica de velas instalada no local no início do século 20. Ginsberg não gostava que seus empregados fossem muito longe quando não estavam na fábrica. Então, conseguiu que a administração municipal mandasse construir em torno dela as primeiras casas do futuro bairro. Foi em uma dessas casinhas que Steve Biko cresceu. Foi criado pela mãe Alice, cozinheira no hospital vizinho. Inteligente e com grande capacidade de liderança, Biko estudava medicina quando foi expulso da Universidade da Província de Natal, no ano de 1972, em razão de suas atividades políticas. No ano seguinte, foi “banido” pelo governo do apartheid. A punição era incrível: ele não estava autorizado a falar com mais do que uma pessoa de cada vez. Também não podia escrever publicamente ou falar com a imprensa. Esta também foi proibida de citar qualquer coisa que ele dissesse. Steve Biko tinha grande preocupação com o desenvolvimento de uma consciência negra. Pensava que tal desenvolvimento teria duas fases: a primeira seria de “libertação psicológica” e a segunda de “libertação física”. A bibliografia aprecia fazer a ligação entre Biko e a não-violência de Gandhi e Martin Luther King, mas ele sempre entendeu que a libertação física só se daria fora das realidades políticas do apartheid. Ou seja, havia antes que derrubá-lo. Outro fato que costuma ficar oculto são suas posições políticas. “Racismo e capitalismo são faces da mesma moeda”, dizia. Em 1972, Biko foi um dos fundadores da Black Peoples Convention (BPC). Trabalhava em projetos de melhorias sociais nos arredores de Durban. Com o tempo, o BPC acabou por reunir cerca de 70 diferentes grupos de consciência negra e associações como o South African Student’s Movement (SASM), que desempenhou um papel significativo na Revolta de Soweto de 1976, a National Association of Youth Organisations e a Black Workers Project que apoiaram os trabalhadores cujos sindicatos não foram reconhecidos sob o regime do apartheid. Biko foi eleito o primeiro presidente do BPC e, como recompensa, recebeu a citada expulsão da escola médica. Sobrou-lhe trabalhar em tempo integral para o BCP. Mesmo banido pelo apartheid, Biko ajudou a criar Zimele Trust Fund, fundo de assistência financeira a presos políticos e a suas famílias. Steve Biko era considerado perigoso pela habilidade para organizar a população e porque procurava investir nas comunidades e inspirar a juventude negra do país. As circunstâncias brutais da morte de Biko tornaram-no um mártir e um símbolo da resistência negra ao regime de apartheid.

Emiliano Zapata cumpriu a promessa que fez ao pai

Zapata – Quando seu pai, Gabriel, camponês e criador de cavalos, chorou de revolta no momento em que ricos fazendeiros tomaram suas terras, seu filho, Emiliano, prometeu que, ao crescer, recuperaria as terras da família. Anos mais tarde, Emiliano cumpriu a promessa feita ao pai. Pena que Gabriel não viveu para testemunhar, ele morreu quando Emiliano tinha 17 anos. O mexicano Emiliano Zapata tornou-se símbolo da luta por justiça social e reforma agrária na América Latina e lutou na Revolução Mexicana (1910 – 1920). Ainda jovem, iniciou sua militância política contra o governo de Porfírio Diaz, que governou para a elite agrária entre 1876 e 1911 um país com 11 milhões de pessoas, a grande maioria analfabetos. Emiliano Zapata Salazar nasceu na pequena San Miguel Anenecuilco em 8 de agosto de 1879. Seu nome começou a ficar conhecido quando Zapata, em maio de 1910, junto com seu grupo, enfrentou a polícia e devolveu a posse de terras aos camponeses, que haviam sido tomadas por latifundiários na região de Vila Ayala, estado de Morelos, região central do México. A ação chamou a atenção de Francisco Madero, político influente que lutava contra Porfírio Diaz, e se aproximou de Zapata. Ambos fizeram um acordo e Madero se comprometeu com Zapata a realizar a reforma agrária se chegasse ao poder. “É melhor morrer de pé do que viver de joelhos”  Emiliano Zapata Zapata inspira a luta dos índios de Chiapas e seu Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN). Saiba mais sobre eles. Após duro conflito armado que começou no norte do país e estendeu-se a outras partes do território mexicano, Porfírio Díaz apresentou sua renúncia e exilou-se na França. Em 1911, Madero é eleito, mas nega-se a realizar a reforma agrária, então Zapata une-se ao líder revolucionário Pascual Orozco e ambos lutam contra o governo central. Em fevereiro de 1913, o general Victoriano Huerta assassina Madero e torna-se ditador. A força demonstrada pelo exército guerrilheiro, liderado por Zapata e Pancho Villa, força a derrubada de Huerta em 1914, que abandona o país. Durante esse período, Zapata e seus liderados foram acusados de não obedecer a chamada “ética da guerra”, tendo liderado execuções sumárias e agido com violência contra seus inimigos. Thomas Sankara lutou contra o fardo colonial na África Nesse momento, Venustiano Carranza toma o poder e estabelece um novo governo constitucional. Os revolucionários liderados por Zapata não apoiam o novo presidente e mantêm sua luta. Preocupado com o crescimento do movimento zapatista, o coronel Jesús Guajardo armou uma armadilha para Zapata a mando do presidente Carranza e do general Pablo González. Para isso, o coronel simulou o desejo de debandar para o lado de Zapata. Desconfiado, o líder revolucionário exigiu provas das intenções de Guajardo, que prontamente mandou assassinar vários ex-zapatistas. Com isso, Zapata compareceu a uma reunião para selar a adesão da tropa do coronel ao movimento liderado pelo revolucionário. Surpreendido, Zapata foi assassinado em 10 de abril de 1919. A versão cinematográfica da história de Zapata foi realizada pelo diretor Elia Kazan com roteiro do escritor John Steinbeck. Viva Zapata! foi lançado em 1952 com Marlon Brando no papel de Emiliano Zapata. Assista ao trailer:   https://urutaurpg.com.br/siteluis/como-augusto-sandino-enfrentou-os-estados-unidos/   A fibra da guerreira latina Juana Azurduy

O romance de Hemingway na Primeira Guerra Mundial

Ernest Hemingway – Ainda muito jovem, Ernest Hemingway já escrevia no jornal Kansas City Star e tentou alistar-se para lutar na Primeira Guerra Mundial. Foi preterido no exame médico por um problema de visão. Não desistiu e conseguiu uma vaga de motorista de ambulância na Cruz Vermelha. Sua experiência na guerra  foi contada no livro Adeus às Armas, lançado em 1929. Durante a guerra, Hemingway foi atingido por estilhaços de uma bomba e internado em um hospital de Milão, na Itália, onde apaixonou-se pela enfermeira Agnes von Kurowsky. Hemingway tinha apenas 18 anos, e Agnes, 26.  No livro de Hemingway, Agnes inspirou a criação da heroína Catherine Barkley. Em 21 de julho de 1899, nascia o escritor Ernest Miller Hemingway na pequena Oak Park, no estado de Illinois, Estados Unidos. Após o fim da guerra, Agnes escreveu uma carta para Ernest em 7 de março de 1919 terminando o relacionamento. Ele tinha retornado aos Estados Unidos em janeiro do mesmo ano e ambos planejavam se casar por lá. Mas Agnes envolveu-se com um oficial italiano. Leia um trecho: “Estou escrevendo tarde da noite após pensar muito e tenho medo de machucá-lo, mas eu tenho certeza que isso não irá feri-lo de forma permanente. Por um tempo antes de você ir embora, eu estava tentando me convencer de que era um caso de amor real, mas nós sempre discordamos nesse ponto e depois eu buscava argumentos que se encaixavam para evitar que você tomasse alguma atitude desesperada. Agora, depois de dois meses longe de você, eu sei que eu gosto de você, mas é mais como uma mãe do que como uma namorada. É certo dizer que eu sou uma garota, mas também sou cada vez menos uma garota a cada dia que passa”. A resposta de Hemingway à carta nunca foi conhecida porque um dos namorados de Agnes queimou toda sua correspondência. Em junho de 1919, Hemingway escreveu para o amigo Howell Jenkins: “Eu a amei outrora e, em seguida ela me trapaceou. E eu não a culpo. Mas eu me propus a cauterizar as lembranças com o método da bebida e outras mulheres e agora tudo se foi”. Em 1937, Hemingway cobriu como jornalista a Guerra Civil Espanhola e mais tarde chegou a combater ao lado dos Republicanos.  Mas essa já é outra história. É possível VER com Dom Juan e Carlos Castañeda Um brinde para o velho Bukowski

As várias versões da música Bella Ciao

Bella Ciao – Símbolo de resistência política em várias partes do mundo, a canção popular italiana Bella Ciao de autoria desconhecida surgiu no final do século XIX como um canto de trabalhadoras rurais das plantações de arroz da região da Padânia, no norte da Itália. Mais tarde, a mesma melodia serviu como base para uma canção de protesto contra a Primeira Guerra Mundial.  Finalmente, a letra da música sofreu algumas mudanças e se tornou um símbolo da Resistência Italiana durante a Segunda Guerra Mundial. A canção também era cantada por integrantes do Movimento Anarquista na Itália e em outros países. Resistência partigiana anti-fascista na Segunda Guerra Neste ano, completam-se 100 anos do início da 1ª Guerra Mundial (1914). O filme Roma Cidade Aberta, de Roberto Rosselini, retrata o período em que muitos italianos lutaram contra o avanço do nazismo na 2ª Guerra Mundial. Em 1943, Rossellini ingressou na Resistência, passando a viver na clandestinidade. Dois meses após a liberação da Itália, em 1945, deu início às filmagens de Roma, Cidade Aberta, considerado um dos marcos fundamentais do neo-realismo italiano.   10 músicas contra a ditadura militar (2) Roma Cidade Aberta retratou a resistência italiana que cantava Bella Ciao Você sabe quem é Luther Blissett? Então, clique aqui. Dezenas de versões já foram feitas de Bella Ciao, ouça algumas:   Versão em italiano: Versão de Manu Pilas para a série “Casa de Papel”: Clipe com imagens da revolta popular no Irã:   Em Techno: Mais uma versão remix: https://youtu.be/Q2SoaopshpA   Mercedes Sosa:   https://www.zonacurva.com.br/grandola-vila-morena-a-cancao-que-embalou-a-revolucao-dos-cravos/  

Derrota da emenda das Diretas Já! amplia consciência

A rejeição da emenda Dante de Oliveira, no início da madrugada de 26 de abril de 1984, pela ausência de parlamentares e voto contrário de deputados do PDS, deixaria entrever situações bastante sui generis para os milhões de brasileiros que, nas capitais estaduais e municípios por todo o país, empenharam-se na luta pela aprovação da emenda que restabeleceria o direito de eleger o presidente da República ainda naquele ano. A eleição para a presidência estava programada, mas seria realizada de modo indireto, através de Colégio Eleitoral. Para que o pleito transcorresse pelo voto popular, ou seja, de forma direta, era necessária a aprovação da emenda constitucional proposta pelo deputado Dante de Oliveira (PMDB – MT). A última eleição direta para presidente fora em 1960. A cor amarela simbolizava a campanha iniciada em 1983. Após duas décadas de intimidação pela repressão, o movimento das Diretas Já ressuscitava a esperança e a coragem da população. A reivindicação sinalizava mudanças não só políticas, mas econômicas e sociais. Dois comícios marcariam o processo: na Candelária, no Rio de Janeiro, em 10 de abril, com um milhão de presentes e, em São Paulo, dia 16, aos gritos de “Diretas Já!”, mais de 1,5 milhão de pessoas lota o Vale do Anhangabaú, na capital paulista. Em Salvador, ocorrera em janeiro com 15 mil pessoas na praça Castro Alves. Entre as figuras de destaque do movimento, o deputado Ulysses Guimarães (PMDB-SP) chegou a ser apelidado de “o Senhor Diretas”. Outros nomes emblemáticos foram a cantora Fafá de Belém (pela interpretação magistral do Hino Nacional) e o apresentador Osmar Santos. Leia texto sobre o comício no Anhangabaú Na noite de 25 de abril de 1984, o Congresso Nacional se reúne para votar a emenda que tornaria possível a eleição direta ainda naquele ano. A população não pode acompanhar a votação dentro do plenário. Temendo manifestações, o governo João Baptista Figueiredo reforça a segurança ao redor do Congresso Nacional. Tanques, metralhadoras e muitos homens deixavam claro que a proposta não interessava ao regime. A expectativa era grande. Mas os 298 votos favoráveis seriam “subtraídos” por 112 deputados que não compareceram e frente aos apenas 65 contrários e três abstenções. Para a aprovação da emenda eram necessários 2/3 a favor ou 320 votos. Uma derrota por 22 votos. As estruturas psíquicas de uma nação são capazes de resistir a golpes bem mais duros. Sobrevivem durante muitos anos, mesmo depois de mudanças infraestruturais profundas. Trata-se de uma agonia lenta para a qual não existe golpe de misericórdia capaz de destruí-las. Preservam-se, ainda que nos mais obscuros recantos do inconsciente coletivo. Fortes o suficiente para enfrentar ou empreender revoluções sociais e combater privilégios voltados a atender interesses de grupos, contra a maioria da população brasileira.   A nacionalidade é uma vinculação existencial inevitável. Não se trata de um ardil ou um álibi. Como hoje, obscuros legisladores nos leva(va)m de roldão – e então, já durante 20 anos após o golpe de 64 – sem se darem conta de que o desejo dos novos oráculos – aos milhões agora – são imediatos e práticos. A solidariedade (mais correto afirmar a cumplicidade) estabelecida em busca de eleições Diretas Já, se traduziria no plano da sublimação por um busca comum de novos valores. A luta, não só continua. Ela é contínua. Derrotava-se uma emenda, mas não a consciência do eleitor. Vale lembrar o quanto as ações de entidades, organizações e comunidades, através de comitês organizados por todo o país, surpreenderam pela decidida forma com que compareceram aos eventos programados a favor da causa legítima, o direito de cada cidadão votar para eleger o seu mandatário máximo. O certo é que ali se tornou impossível aos que detinham o poder manter o povo brasileiro sob a acusação de subversão e à imposição de tirânicas leis de segurança e emergência, em meio a uma economia que asfixiava a todos os setores, indistintamente. O pleito seria consumado em janeiro de 1985 no colégio eleitoral. Tancredo Neves (PMDB) derrotaria Paulo Maluf (PDS) e um novo pesadelo atravessaria a noite no Brasil, mas aí já é outro capítulo da história. Matéria da TV Brasil sobre a rejeição da emenda das Diretas Já!:   Henfil e as Diretas JÁ!

DRUNKEN DUMBSHOW – O fim de Jack Kerouac

Jack Kerouac bebeu até morrer. Bebeu ao que tinha e não tinha, até lhe sobrarem míseros 91 dólares em sua conta bancária. Bebeu para homenagear o fim abrupto de suas amizades mais próximas e ao seu desligamento completo de uma vida social ativa. Bebeu até morrer – metaforicamente – no colo de sua mãe, Gabrielle Kerouac. O escritor norte-americano Jack Kerouac  nasceu em  12 de março de 1922 na pequena Lowell, em Massachussets.  Jean-Louis Lebris de Kerouac, ou Jack para os íntimos, morreu de cirrose hepática aos 47 anos no dia 21 de outubro de 1969, em sua casa em St. Petersburg, Flórida, EUA. Sozinho, miserável e completamente dependente de suas cervejas e seu scotch, Kerouac morreu isolado, paranoico e à mercê de sua própria lenda estradeira. No início da década de 1960, Kerouac saturou-se de si mesmo. Afogou-se completamente em sua própria história. O boom da publicação de On The Road, três anos antes, não somente o pegou de surpresa como também o colocou na posição de Rei dos Beats, esse na obrigatoriedade de fazer jus a tudo que havia escrito sobre si mesmo. O que as pessoas não viam, ou pareciam não ver, é que o autor da obra-prima estradeira norte-americana já estava com 35 anos e lutava – até então bravamente – para vencer o alcoolismo. Tudo em vão. Com o tão esperado reconhecimento literário em 1957 – sete anos após escrever o manuscrito original de sua obra-prima – Kerouac se viu arrastado de cabeça para o mundo do showbusiness. Qualquer adolescente topetudo faria de tudo para poder pagar uma cerveja ao herói Dean Moriarty em pessoa (mal sabiam que na realidade, Kerouac havia apenas seguido a fúria incontrolável de Neal Cassady, o verdadeiro Dean). As universidades, tão avantgardes, queriam o Rei dos Beats para palestrar, ministrar oficinas e até jogar um papo ou outro fora, tudo pelo prazer da companhia. Além do mais, sua editora queria um novo romance para ontem, para assim suceder o sucesso no mercado de seu antecessor. Kerouac se viu emparedado e assim se entregou de vez ao acalento momentâneo de um bom porre, o fazendo cada vez mais e mais frequente. Obviamente, hora ou outra, o escritor surtaria de vez e perderia as rédeas de sua própria vida. Para evitar o inevitável, Kerouac recorreu ao amigo e também escritor, Lawrence Ferlinghetti em busca de alguma solução. Ferlinghetti, em todo o esplendor de sua bondade e amizade, ofereceu a Kerouac sua pequena cabana em Bixby Canyon, na Califórnia, para que o amigo pudesse se esconder por alguns meses e fosse capaz de colocar a cabeça no lugar. A história, todos conhecem, Kerouac a relatou sem censura no livro Big Sur (sua última obra-prima) que fora publicado em 1961. Daí por diante, meus amigos, o negócio só piorou. Após o surto psicótico relatado em Big Sur – em que Kerouac afirma ter tido uma visão e nessa ter sido capaz de enxergar a imagem de uma cruz – o escritor se tornou, pouco a pouco, uma pessoa reclusa e sua visão política, influenciada pelo conservadorismo de sua mãe e por seu catolicismo de berço, foi se tornando cada vez mais reacionária e autodepreciativa, chegando ao ponto de causar um afastamento completo de seus companheiros de outrora: Allen Ginsberg, William Burroughs, Gregory Corso, Gary Snyder e John Clellon Holmes. Kerouac havia forçado, mesmo que involuntariamente, o seu fim psicológico e físico. Esqueçam-se do bonitão, gostoso e boa pinta Jack Kerouac dos anos 1940 e 50. Em 1963, Kerouac já havia se tornado um homem inchado, completamente ranzinza e estava começando a perder os seus cabelos. O grande herói das estradas americanas só conseguia se locomover por apenas uma estrada: a que ligava a casa de sua mãe, em Lowell (sua cidade natal) até o bar em que ele costumava frequentar. O beat William Burroughs e o rock A decadência de Kerouac calhou ser exatamente no mesmo período em que a contracultura dava as caras nos Estados Unidos. Por exemplo: em 1964, Ken Kesey, Neal Cassady e os Merry Pranksters chegaram até a costa leste com o seu ônibus colorido nomeado de “Further” com basicamente um só norte: conhecer Jack Kerouac, autor do livro que os havia inspirado a sair de casa e conhecer “a velha estrada”, agradecê-lo e quem sabe até dar-lhe um aperto de mão.  Allen Ginsberg fez a ponte entre Kesey e Kerouac, e o encontro foi um belíssimo desastre. Pior: tudo está relatado em vídeo pra quem quiser procurar. Kerouac passou três horas sentadas num sofá, bebendo a cerveja que havia trazido de casa, sem dizer uma palavra sequer, e quando abriu a boca foi só pra reclamar. Reclamar de Cassady, Ginsberg ou do azarado que cruzasse sua linha de visão e ele tirasse pra cristo. Timothy Leary, o místico professor e propagador dos alucinógenos durante a contracultura, culpa Kerouac por ser o responsável por sua primeira badtrip de ácido. Um ano antes do incidente com Kesey & os Pranksters, Allen Ginsberg decidiu apresentar o novo amigo ao velho escritor e o persuadiu a tentar uma experiência com LSD, diz a lenda (ou artigos da web) que Kerouac entrou num surto psicótico e apavorou Leary ao ponto desse entrar em estado catatônico em um canto, colocar-se em posição fetal e ficar por lá, durante as 12 horas da viagem. Não muito após o incidente, o escritor acusou Leary e suas substâncias de terem provocado significativos danos ao seu cérebro, esses “incuráveis” nas palavras do escritor. A produção de Kerouac oscilou, assim como suas histórias e suas recém-criadas versões para fatos já relatados. Se existe uma palavra que pode definir o escritor em seus últimos anos, a palavra é CONTRADIÇÃO. Visions of Gerard, Satori em Paris e Vanity of Dulouz foram suas três últimas publicações. Em todas, Kerouac procura encontrar um fio conector para os livros anteriores, para que assim pudesse concluir a chamada “Lenda de Dulouz” – sua própria história – relatada em todos os seus romances.  Era a sua maior obsessão: concretizar a lenda. Kerouac havia se casado duas vezes, na metade da década de 40 e

Decisão judicial inédita reconhece tortura do regime militar em certidão de óbito

João Batista Franco Drummond – Após 38 anos, a família de João Batista Franco Drummond conseguiu, na semana passada, novo atestado de óbito do militante assassinado pelo regime militar. Em decisão inédita, Tribunal de Justiça de São Paulo deferiu pedido de retificação de sua certidão de óbito. Em uma decisão de dois votos contra um, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu acatar o pedido de retificação do Atestado de Óbito de João Batista Franco Drummond, constando que ele foi morto sob tortura no DOI-Codi do II Exército em São Paulo no ano de 1976. No dia 29 de março de 2012, na 1ª instância, houve parecer favorável. A partir daí, o Ministério Público do Estado de São Paulo colocou objeção quanto à palavra “tortura”, argumentando ter “ausência de prova” para o que foi denunciado e requerido no atestado. “Esse é o primeiro caso ocorrido no nosso país em que uma família pleiteou perante o Poder Judiciário a retificação da certidão de óbito do seu ente querido. Posteriormente tivemos dois casos, ambos tramitaram na segunda Vara de Registros públicos de São Paulo que são os casos de Vladimir Herzog e Alexandre Vannuchi Leme”, detalhou o advogado da família Drummond, Egmar Santos. Desde que seu marido foi assassinado, Maria Ester Cristelli Drummond teve que se exilar com a família e mora até hoje na França, com as duas filhas, Rosa e Silvia Drummond, que conviveram desde crianças com a morte traumática do pai. Ela assinou o pedido em 2011 e detalhou para o advogado o sofrimento que se prolonga nos dias de hoje. “Maria Ester se nega a apresentar para os netos a versão da farsa [montada pela Ditadura]. A decisão da sessão de hoje é o findar de um martírio”, relatou Egmar Santos, diante dos juízes. Contradições nos documentos Os familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos do Brasil acompanham este caso e encontraram contradições em diversos documentos. O laudo falso assinado pelos médicos legistas Abeylard de Queiroz Orsini e José Gonçalves Dias, orientado por outro legista e na época diretor do IML de São Paulo, Harry Shibata, descreve que João Batista foi morto por atropelamento na Avenida Nove de Julho, esquina com a Rua Paim, bairro da Bela Vista, local distante do bairro da Lapa. O relatório do Ministério da Aeronáutica entregue ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa, em 1993, diz que João Batista “foi morto em confronto com agentes dos órgãos de segurança”. Segundo o relatório do Ministério da Marinha, Batista “foi morto num tiroteio em 16 de dezembro de 1976, no bairro da Lapa, quando a casa em que se encontrava com outros companheiros foi invadida pelos agentes de segurança”. O advogado Egmar Santos acrescentou que Harry Shibata foi cassado e expulso como médico-legista pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo. Restabelecimento da verdade A Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) e a Comissão Nacional da Anistia já haviam reconhecido que João Batista Drummond foi morto nas dependências do DOI-Codi em decorrência das torturas. A Lei dos Registros públicos estabelece que descreva se a morte foi natural ou violenta. O pedido da família ressalta no princípio que é preciso se estabelecer a verdade sobre todas as circunstâncias dos fatos ocorridos durante a Ditadura no Brasil. O caso de João Batista Franco Drummond faz parte da lista de 164 casos tratados pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. O presidente da Comissão, deputado Adriano Diogo (PT), disse que a decisão obtida no caso vai ajudar no trabalho de retificação dos outros mortos e desaparecidos. Há uma negociação junto à defensoria Pública de São Paulo para ajudar na retificação de outros atestados de pessoas assassinadas pela Ditadura Militar (1964-1985). O advogado Egmar Santos afirmou que o Poder Judiciário precisa criar mecanismos para reconhecer o estabelecimento da verdade já que o poder Executivo tomou a iniciativa criando, inclusive, a Comissão Nacional da Verdade. O relator da Apelação foi o desembargador Álvaro Passos. Apenas o desembargador Giffoni Ferreira foi a favor da interposição do Ministério Público. João Batista Franco Drummond era economista, militou em diversas organizações contra o regime ditatorial, passando pela Ação Popular até chegar no Partido Comunista do Brasil (PC do B). Estava há 10 anos na clandestinidade, já tinha sido condenado pela lei de Segurança Nacional, sendo julgado pela Justiça Militar entre 1969 e 1970. Acabou assassinado na conhecida “Chacina da Lapa”, ocorrida em 16 dezembro de 1976, quando foram mortos também Ângelo Arroyo e Pedro Ventura de Araújo Pomar.

Henfil e as Diretas JÁ!

Henfil – O cartunista e jornalista Henfil foi quem chamou pela primeira vez o movimento pelas eleições diretas para presidente de Diretas Já. Henfil morreu em 4 de janeiro de 1988 e, infelizmente, não presenciou o brasileiro votar para presidente da República depois de quase três décadas, o que só aconteceu em 1989. Durante o período dos comícios das Diretas Já nos primeiros meses de 1984, Henfil publicou crônicas e algumas charges retratando a mobilização em sua coluna Cartas da mãe, publicadas na revista Istoé. Ele colaborou na publicação entre 1977 e 1984. “Eu tento 24 horas por dia ser bom-caráter”, Henfil, que nasceu em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, em 5 de fevereiro de 1944. No carnaval de 1983, Henfil desembarcou em Alagoas para entrevistar Teotônio Vilela, que apesar de seu passado udenista, lutava por eleições diretas para presidente após anos e anos de regime de exceção. A longa entrevista foi publicada em três partes no Pasquim. Em 1984, Henfil publicou o livro Diretas Já! com textos e charges sobre o tema.Teotônio lutava contra um câncer e morreu em novembro de 1983 e não teve a chance de assistir a enorme mobilização popular das Diretas Já! Henrique de Souza Filho, Henfil, criou uma ampla galeria de personagens como Cumprido e Baixim, Graúna, Bode Orelana, Capitão Zeferino. Publicou em diversos veículos de comunicação como Jornal do Brasil, O Globo, Jornal dos Sports e na já citada Istoé. Em 1972, lançou a revista Fradim, pela editora Codecri, que reunia sua produção. Mas foi no Pasquim que o trabalho de Henfil encontrou seu habitat natural. O professor e jornalista Dênis de Moraes escreveu O rebelde do traço, biografia sobre Henfil, lançada em 1996. No prefácio, o jornalista Jânio de Freitas ressalta que, entre Henfil e Pasquim, houve a junção das forças demolidoras do sarcasmo e da ironia para “oxigenar as mentes oprimidas pelo pesadelo diuturno da boçalidade ditatorial”. LEIA TEXTO SOBRE OUTRO COLABORADOR DO PASQUIM, O JORNALISTA FAUSTO WOLFF Hemofilia e trabalho incessante Hemofílico, Henfil foi criado em ambiente difícil: seu irmão mais velho, José Maria, sangrou até morrer com apenas 2 anos e 2 meses e todos seus irmãos sofreram com a hemofilia. Assim como Henfil, que morreu de AIDS devido a uma transfusão de sangue com apenas 43 anos, o vírus do HIV também vitimou seus dois irmãos Herbert José, o conhecido sociólogo Betinho, e o caçula, o músico Chico Mário. O documentário Três Irmãos de Sangue, de Ângela Patrícia Reiniger trata da trajetória dos três irmãos e ouviu figuras como Ziraldo, Jaguar, Frei Betto e muitos outros. Vale assistir: Sobre sua infância, Henfil lembrou: “andar era uma tarefa para profissionais, o mesmo preparo que o Nelson Piquet tem para pilotar eu tinha que ter para andar, não podia falhar”. O Brasil despertou no movimento das Diretas Já! Betinho liderou a campanha Ação da Cidadania em 1993, que mobilizou o país em busca de soluções para as questões da fome e miséria. Herbert foi imortalizado na música O Bêbado e o Equilibrista, de Aldir Blanc e João Bosco, conhecida pela voz de Elis Regina. Para quem não lembra, a letra diz: “meu Brasil!… Que sonha com a volta do irmão do Henfil. Com tanta gente que partiu. Num rabo de foguete”. A gravação da música por Elis foi considerada por muitos uma bandeira branca de Elis para Henfil, que tinha criticado duramente, em charge do personagem Cabocô mamadô, a cantora por sua participação na abertura da Olimpíada do Exército, em 1972. Em charge de Cabocô, Elis regia o coral dos mortos-vivos composto por Roberto Carlos, Tarcísio Meira, Pelé, entre outros. Elis reclamou da intolerância de Henfil que reagiu com mais ácidas charges. “Os meus colegas, na sua maioria, optaram pela escola, ou seja, pela imitação, pela falsificação, eles se camuflaram de gente comum, de gente igual a todo mundo. Eu não consegui, como alguns outros, principalmente os mais pobres, que também não conseguiram”, Henfil Henfil trabalhava tanto que chegou a ficar curvado devido às intermináveis horas que passava em sua mesa de trabalho. Em entrevista ao Pasquim, chegou a dizer: “eu não tô reclamando do trabalho, porque o trabalho me traz felicidade … O meu trabalho era excessivo, eu trabalhava em 10 lugares”.  Henfil blogueiro É impossível não imaginar como seria o blog do Henfil. Sem dúvida, seu trabalho que misturava crônica, charge, ironia e agilidade combinaria, e muito, com o espaço livre para a comunicação na internet. Em recente entrevista à revista Carta Capital, seu filho, Ivan Consenza, que preserva parte do acervo do desenhista, afirmou: “sempre que imagino meu pai no mundo de hoje, vejo-o como um dos primeiros blogueiros possíveis. Isto porque ele tinha necessidade extrema de comunicação, exauria-se em responder de próprio punho toda e qualquer carta de leitor”. Além disso, Henfil sempre teve consciência de seu talento e queria divulgar seu trabalho além do Brasil, o que a internet poderia colaborar hoje. Com esse pensamento de ser reconhecido na gringa, Henfil embarcou para Nova Iorque, superando seu pânico de avião. Ele explica os motivos de sua viagem em entrevista ao Pasquim: “quero levar meu know-how ideológico pro mundo inteiro. Eu tenho uma outra pretensão. Não tenho pretensão de ganhar dinheiro, a não ser para facilitar meu trabalho. Eu não tenho pretensão de ganhar fama e sucesso, inclusive porque no meu tipo de agressividade a fama é ruim, porque eu posso ser agredido ao ser reconhecido”. “Quero lutar por uma coisa babacamente chamada babacamente de redenção dos povos. Vivo e respiro luta de classes”, Henfil Sobre a experiência de viver nos Estados Unidos, Henfil escreveu o livro Diário de um Cucaracha (1983). Passou uma temporada também na China e escreveu Henfil na China, antes da Coca-Cola (1984). O seu primeiro livro foi Hiroshima, meu Humor, de 1976. Atrás do prefácio de Millôr Fernandes para seu primeiro livro, Henfil embarcou de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro. Millôr lhe deu o cano. Na mesma entrevista ao Pasquim, Henfil conta que ficou três dias atrás do Millôr: “lá em Belo