Zona Curva

As “fake news” como estratégia eleitoral

por Carlos Castilho

Ao que tudo indica não vamos discutir apenas candidaturas e propostas na campanha eleitoral para a votação do dia 7 de outubro. As notícias falsas, mais conhecidas pela expressão inglesa fake news, também entrarão no debate porque os candidatos e líderes partidários já incorporaram a manipulação informativa e o questionamento de credibilidade como estratégias eleitorais tão ou mais eficientes do que a temática política.

A campanha eleitoral ainda está morna, mas o poder judiciário e os grandes conglomerados industriais da imprensa já se lançaram numa ofensiva midiática para marcar seu controle na definição dos códigos informativos que condicionarão o comportamento dos eleitores no debate sobre quem diz a verdade e quem está mentindo.

A estratégia da justiça e da grande imprensa é condicionar o debate sobre credibilidade aos padrões adotados por ambas instituições, seja através de normas legais, seja por meio do uso de ferramentas informativas como verificação de veracidade ou checagem de fontes, mecanismos também conhecidos pelo jargão jornalístico fact checking.

Nem o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e nem a mídia hegemônica informarão ao público que existe uma diferença significativa entre discurso e realidade na questão das fake news. O discurso assumido por quem tenta controlar os códigos informativos eleitorais vincula a questão da credibilidade a princípios morais e supostamente científicos sobre o que é ou não verdade. A eficiência do discurso depende da insistência com que ele for repetido com o objetivo de fixar determinadas ideias, ou códigos informativos, na mente dos eleitores.

A realidade do debate sobre credibilidade noticiosa é bem outra. É muito difícil determinar o que é verdade e o que é mentira porque ambas são caracterizadas pela subjetividade, ou seja, são condicionadas pela visão de mundo de cada individuo. Já está provado cientificamente que não existe uma verdade absoluta, da mesma forma que uma mentira sempre tem alguma base real para que possa ter um mínimo de veracidade. Aceitar esta constatação implica diminuir o impacto das decisões do binômio justiça/imprensa, o que nenhuma das partes admite.

Hoje, a avalancha de informações publicadas na internet aumentou incrivelmente a quantidade de versões e opiniões sobre um mesmo fato, dado ou evento, o que torna muito difícil estabelecer qual delas tem o privilégio de ser considerada a verdadeira. O máximo que se pode estabelecer é qual delas é a mais veraz, mas isto implica relativizar os padrões da justiça e da imprensa.

Nossos dilemas diante da desinformação eleitoral

A moderna luta pelo poder político

A polêmica em torno das fake news é um exemplo clássico da moderna luta pelo poder na sociedade moldada pela informação digital. Não se trata mais de empregar a força para impor um conceito de verdade, o que equivaleria a usar o mesmo princípio da censura, mas de determinar quais os critérios, ou códigos informativos, que a opinião pública usará para condicionar a tomada de decisões individuais ou coletivas. A partir desta visão, o tema fake newstorna-se essencialmente político e não um problema moral.

notícias falsas

A classificação de uma notícia como falsa ou verdadeira é um processo complexo, demorado e sujeito a controvérsias. Os juízes TSE não dispõem de elementos técnicos e muito menos de tempo para promover uma investigação consistente sobre a veracidade de fatos, dados e eventos durante a campanha eleitoral. Por isto atribuíram à imprensa e aos institutos de verificação de dados a responsabilidade de promover a checagem das informações formalizando uma aliança informal que sujeitará os eleitores a critérios estabelecidos por organizações cujos métodos de verificação estão submetidos a questionamentos.

Os Estados Unidos são hoje o cenário do mais sofisticado uso de estratégias políticas baseadas em fake news. O presidente Donald Trump diz o que bem entende partindo do princípio de que a repetição de uma notícia falsa e da desinformação acabará por tornar socialmente verdadeira uma afirmação. Por outro lado, tudo aquilo que contradiz a versão presidencial é taxado como notícia falsa, o que atinge a credibilidade da imprensa.

Os posicionamentos e interesses políticos atropelaram a preocupação com a checagem dos fatos porque tanto o governo como a imprensa norte-americana têm estratégias sobre como manipular o debate público na questão das fake news. Isto leva o eleitor a ter que decidir sozinho o que pode ser mais ou menos verdadeiro. É uma tarefa difícil, mas de certa maneira benéfica porque nos leva a vivenciar concretamente as dúvidas e incertezas da era digital.

LEIA OUTROS TEXTOS DE CARLOS CASTILHO EM SUA PÁGINA NO MEDIUM

Rolar para cima