Zona Curva

O encontro entre Anais Nin e Henry Miller

 “Ele pede para me ver novamente. Quando espero na poltrona de seu quarto, e ele se ajoelha para me beijar, é mais estranho do que todos os meus pensamentos. Com sua experiência ele me domina. Domina com sua mente, também, e fico calada. Sussurra para mim o que meu corpo deve fazer. Eu obedeço, e novos instintos são despertados em mim. Ele me tomou…

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Henry Miller e Anais Nin, algumas décadas depois do encontro (fonte: http://www.tomorrowstarted.com/)

…Um homem tão humano; e eu, súbita e desavergonhadamente natural. Fico assombrada de ficar ali deitada na cama de ferro dele, com a minha roupa de baixo preta arrancada e pisada. E minha intimidade apertada quebrada por um momento, por um homem que se diz ser “o último homem na terra”.

Escrever não é, para nós, uma arte, mas respirar. Depois de nosso primeiro encontro respirei alguns bilhetes, acentos de reconhecimento, admissão humana. Henry ainda estava atordoado, e eu exalava a alegria insuportável. Mas da segunda vez, não houve palavras. Meu prazer era intocável e aterrador. Inflava dentro de mim ao caminhar pelas ruas.

Ele transpira, ele fulgura. Não consigo escondê-lo. Sou mulher. Um homem me submeteu. Ah, que prazer quando uma mulher encontra um homem a quem consegue se submeter, o prazer de sua feminilidade expandindo em braços fortes”.

(trecho do livro Henry, June eu – delírios eróticos, de Anais Nin, editora Círculo do Livro)

A escritora francesa Anais Nin morreu em 14 de janeiro de 1977, aos 73 anos, em Los Angeles, nos Estados Unidos.

O livro Henry, June e eu – delírios eróticos relata o período em que Nin conhece Henry Miller e sua mulher à época, June. Depois que se conheceram, Nin e Miller tornaram-se confidentes e trocaram correspondência entre 1931 e 1946. O livro foi adaptado ao cinema em 1990 pelo cineasta Philip Kaufman.

Nin escreveu ficção, ensaios e críticas, mas ficou conhecida pelo seu extenso diário que começou a escrever com apenas 11 anos. Os escritores se conheceram quando Anais convidou o advogado Richard Osborn para almoçar em sua casa e Osborn levou seu amigo Miller, então com 40 anos, conhecido fila-bóia e sempre com pouca grana. Na época, Nin trabalhava em seu primeiro livro, um ensaio crítico sobre o escritor inglês D. H. Lawrence, cujo livro O Amante de Lady Chatterley, publicado em 1928, foi proibido na Inglaterra e causou enorme rebuliço. Nin era grande admiradora de Lawrence.

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Ilustração de Lisa Congdon (fonte: site Brain Pickings)

Os dois escritores formaram um dos mais fascinantes casais da literatura. De um lado, o escritor mundano ou escritor-gangster (como alguns amigos chamavam Miller quando queriam provocá-lo), biscateiro e outsider. Do outro, uma sofisticada intelectual parisiense de educação refinada. Nin era filha de um pianista espanhol e de uma cantora dinamarquesa que se conheceram em Cuba.

O que os uniu foi a imensa curiosidade pelo novo, um certo desespero existencial e a busca por novas formas de expressão mais adequadas à realidade da época. Ambos acabaram conhecidos pelo viés autobiográfico de suas obras.

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